A teoria Biossocial da RO-DBT

O transtorno do supercontrole, segundo Lynch, pode ser explicado pela combinação de três elementos: natureza, criação e enfrentamento. A teoria Biossocial da RO-DBT postula que a transação entre estes três componentes  leva ao enfrentamento supercontrolado.

Figura 1. Teoria Biossocial para Transtornos do Supercontrole

Vamos a cada um deles:

NATUREZA

Quando falamos sobre o componente natureza, nos referimos ao biotemperamento. Indivíduos supercontrolados apresentam uma predisposição genética e biológica que afeta a maneira como eles percebem o mundo e regulam suas emoções. 

Quatro características biogenéticas estão presentes em indivíduos supercontrolados: 

  1. baixa sensibilidade à recompensa (que acarreta em experiências diminuídas de prazer espontâneo);
  2. alta sensibilidade à ameaça (que leva a estados intensificados de excitação defensiva e ansiedade);
  3. alto controle inibitório  (apresentam capacidades superiores de autocontrole, tolerância ao mal-estar e de adiar gratificação. Comportamento excessivamente controlado por regras);
  4. alto processamento focado em detalhes (atenção priorizada aos detalhes em  detrimento a um processamento mais global. São ótimos em ver a árvore, mas  não veem a floresta). 

CRIAÇÃO

O segundo componente da Teoria Biossocial é a Criação, que contempla  elementos históricos (traumas na infância, aprendizagens passadas) e contemporâneos (relacionado à vivências, aprendizagens e relações estabelecidas no  momento  presente).

Em relação às influências socio-biográficas temos: 

  1. Cultura (em uma sociedade que valoriza o individualismo em detrimento  ao  coletivo);
  2. Familiar (famílias  perfeccionistas ou desorganizadas);
  3. Pares (se há  bullying  ou exclusão social);
  4. Eventos ambientais adversos de afastamento social (como por exemplo, furacão, fome etc.).

No  âmbito  familiar,  a forma como os pais se relacionam com o filho irá influenciar a maneira como esta criança vê o mundo. Se os pais (e/ou pessoas com quem a criança convive) enfatizam que erros são intoleráveis e inaceitáveis, a criança pode aprender que ela nunca é boa o suficiente, podendo levar a um  perfeccionismo mal adaptativo.

Também aprende a evitar riscos para prevenir a possibilidade de cometer erros; se torna altamente sensível às críticas e se compara aos outros para medir o seu  valor.  

Abaixo, podemos ver alguns  exemplos de comportamentos que são  punidos ou reforçados pelo  ambiente.

Figura 2. Tipos de comportamentos e suas consequências.  

ENFRENTAMENTO

O terceiro componente da Teoria Biossocial é o enfrentamento. Trata-se da interação entre o biotemperamento e as influências socio-biográficas que leva a um estilo de enfrentamento supercontrolado mal-adaptativo.

Para reduzir a probabilidade de cometer erros e parecer  vulnerável ou fora de  controle, o indivíduo pré-supercontrolado aprende a evitar riscos não planejados, a mascarar sentimentos, focar em pequenas discrepâncias e permanecer indiferente e distante de outras pessoas. Com o passar do tempo, o indivíduo se torna cada vez mais rígido, uma vez que o padrão comportamental é reforçado de forma intermitente (por exemplo, ao evitar a auto revelação, reduz-se a ansiedade antecipatória; comportamentos típicos de SC como seguir regras e fazer sacrifícios em prol de algo maior,  podem gerar elogios e apreciação de outras pessoas).

Em relação  à interação com outras pessoas, indivíduos super controlados tendem  a ser reservados e distantes, o que dificulta que vínculos mais profundos sejam estabelecidos. É uma via de mão dupla: ao mascarar sentimentos íntimos e não se mostrar vulnerável, ao mesmo tempo em que pode se proteger da desaprovação social, a longo prazo aumenta a sensação de solidão e isolamento. 

Em relação ao componente enfrentamento temos, portanto, um indivíduo que desenvolveu uma maneira específica de se comportar a partir de sua condição biológica + ambiente que reforçou alguns padrões comportamentais e puniu outros. 

Considerações finais

A  teoria Biossocial da RO-DBT postula que a transação entre três elementos (natureza + criação + enfrentamento) leva ao estilo comportamental supercontrolado.

Enquanto o componente natureza refere-se a características genéticas e biológicas específicas; a criação, à história familiar, aprendizagem e cultura; o terceiro elemento refere-se a maneira como o indivíduo se comporta, o enfrentamento.

A transação entre estes três elementos, portanto, explica o funcionamento supercontrolado de alguns  indivíduos.

Referência Bibliográfica:

Lynch, T. R. (2018). Radically open dialectical behavior therapy: theory and practice for treating disorders of overcontrol. New Harbinger Publications.

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Michele Cassiano

Escrito por Michele Cassiano

Psicóloga clínica (UNESP-Bauru), especialista em Terapia Comportamental (ITCR-Campinas) e Terapia Comportamental Dialética (DBT Brasil e CTC Veda).
Treinadora de Habilidades DBT.
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