O Jogo do Bom Comportamento – Good Behavior Game – na escola

Jogo do Bom Comportamento como parte do SACE/PBIS

O problema da indisciplina escolar é um grande desafio para todos nós e eu já escrevi aqui, neste portal, sobre o framework fundamental para se implementar práticas com evidência científica na escola para a melhoria deste quadro tão grave. Este sistema se chama Positive Behavioral Intervention and Support – PBIS [1], que foi descrito e analisado em um texto em português submetido a uma revista acadêmica, mas ainda não publicado, traduzido para Serviço de Apoio Comportamental Escolar – SACE, de Melo, Jessel, Lemos e Lacerda, em breve ao alcance do público.

Só para contextualizar, este sistema é composto de 3 níveis de intervenção, sendo o primeiro universal, para todos os estudantes e o segundo e terceiro níveis são dedicados àqueles com risco de comportamento-problema [1]. Em cada um desses níveis, o SACE/PBIS permite o reconhecimento e utilização de práticas que produziram evidência científica de efetividade e no primeiro nível, uma das práticas mais bem estabelecidas é a do Jogo do Bom Comportamento – Good Behavior Game, que nos dedicamos aqui a descrever brevemente.

Jogando com os estudantes

A formulação do Jogo do Bom Comportamento propõe uma contingência de grupo, gamificada, que permite endereçar os comportamentos-problema em sala de aula de modo bastante lúdico e, ainda assim, competente [2]. O Jogo do Bom Comportamento tem inúmeras variações e replicações sistemáticas [3] permitem verificar o peso de cada um de seus aspectos na composição final de seu impacto, mas vale a pena elencar aqui uma forma mais simplificada de implementação, para que possamos visualizar o processo:

  1. O Professor debate com os estudantes a definição de que comportamentos podem ser considerados como “comportamento-problema” e devem ser endereçados no jogo.

É natural que comportamentos como “falar sem autorização do professor”; “levantar sem autorização do professor”; “sair da sala sem autorização do professor”; “gritar”; “bater no colega”; “jogar coisas no colega”; entre outros, possam ser listados. Os comportamentos são escritos e expostos a todos.

  • O Professor divide a sala em dois grupos e pede para que cada um escolha um nome.

Em outras variações, o Professor nomeia com títulos padronizados como “time azul” e “time vermelho”. É preciso que os grupos sejam facilmente identificados, o que normalmente se faz pela divisão simétrica da sala, de um lado um grupo e de outro lado, o grupo oposto.

  • O Professor apresenta as regras e o jogo começa

Usualmente, as regras são as seguintes. O Professor, quando verifica a ocorrência de algum comportamento-problema, faz um risco na lousa do lado do grupo que o emitiu. Existe um limite até o qual ambos os grupos podem emitir comportamento-problema, mantendo a vitória para ambos. Por exemplo, se os grupos tiverem até 5 ocorrências em aula, ambos terão acesso ao prêmio, mas a partir de 5 ocorrências, o que apresentar menor incidência será o vitorioso e terá acesso ao prêmio. Sempre que o Professor verifica a ocorrência do comportamento-problema, ele coloca um risco na lousa, sem dar atenção a quem se comportou.

  • Premiação do grupo campeão ou de ambos

Ao fim do período se verifica que grupo foi vencedor ou se ambos podem ter acesso ao prêmio. O prêmio é dado ao grupo ou a ambos. Este prêmio deve ser reforçador ao menos para grande parte da sala e essas preferências devem ser consideradas na hora de sua definição. Pode ser sair um pouco antes da sala, eximir-se de alguma atividade acadêmica ou ficar no celular ainda durante a aula, entre muitas outras inúmeras possibilidades. [2]

Compreendendo o procedimento

O Jogo do Bom Comportamento pretende ser um procedimento em que um reforçador pode alterar o comportamento do grupo, mas também o próprio grupo pode contribuir com a modificação do comportamento dos indivíduos em particular (especialmente porque qualquer reforçador escolhido não será reforçador para todos), o que foi chamado de influência dos pares (“peer influence”) [2]

O procedimento já foi avaliado em metanálise de Ensaios Controlados Aleatorizados [4] e também em metanálise específica de estudos de delineamento de sujeito-único [5], com resultados variáveis em diversas áreas, mas com um forte consenso em torno da redução de comportamento-problema em sala de aula, em um nível universal de aplicação.

Outro consenso fundamental para o campo é que o Jogo do Bom Comportamento não necessita de uma formação exaustiva em campos teóricos a que o Professor pode não estar familiarizado e também que o procedimento não depende de grande organização e estrutura, sendo um recurso potencial valoroso para se implementar na escola [2].

E tem mais uma coisa boa, tem pesquisa brasileira implementando aqui, nas terras tupiniquins, o Jogo do Bom Comportamento. Fica a dica quentíssima da leitura da Dissertação de Mestrado da Lívia Bomfim, com a implementação do procedimento que discutimos neste brevíssimo texto [6]

[1] Ryan, C., & Baker, B. (2020). The PBIS team handbook: Setting expectations and building positive behavior. Free Spirit Publishing.

[2] Tingstrom, D. H., Sterling-Turner, H. E., & Wilczynski, S. M. (2006). The good behavior game: 1969-2002. Behavior modification30(2), 225-253.

[3] começando por Medland, M. B., & Stachnik, T. J. (1972). Good‐Behavior Game: A Replication and Systematic Analysis 1. Journal of Applied Behavior Analysis5(1), 45-51.

[4] Smith, S., Barajas, K., Ellis, B., Moore, C., McCauley, S., & Reichow, B. (2021). A meta-analytic review of randomized controlled trials of the good behavior game. Behavior Modification45(4), 641-666.

[5] Bowman-Perrott, L., Burke, M. D., Zaini, S., Zhang, N., & Vannest, K. (2016). Promoting positive behavior using the Good Behavior Game: A meta-analysis of single-case research. Journal of Positive Behavior Interventions18(3), 180-190.

[6] Bomfim, L. F. (2018). Promovendo comportamentos adequados em sala de aula: efeitos da aplicação de uma variação positiva do Good Behavior Game em uma escola pública brasileira.

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Classificação do artigo

Escrito por Lucelmo Lacerda

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