O Valor das Emoções

O que eu sinto é importante, me marca e me ajuda a caminhar em direção aos meus valores.

Antes de prosseguir gostaria de lhe fazer um convite, querido/a leitor/a: por um momento se pergunte “Qual o valor das minhas emoções?” e aguarde a/s resposta/s, não force nenhuma reação, caso não obtenha nenhuma resposta não tem problema. Agora registre sua/s resposta/s em um papel ou no bloco de notas do seu celular, quando terminar a leitura deste texto volte a sua anotação e veja se algo mudaria na sua resposta ao questionamento feito acima. Podemos combinar dessa forma?

Então vamos lá….

A proposta deste texto é apresentar uma breve descrição do que são as emoções, bem como, a importância que elas têm em nossa vida e nos nossos relacionamentos.

Os nossos comportamentos são frutos e marcados por interações, sejam elas conosco mesmo, isto é, em contato com o nosso universo particular por debaixo da pele (e.g.: sistema fisiológico e comportamentos encobertos/privados) ou com o ambiente que nos cerca (e.g.: família, pares, sociedade e cultura de modo geral). Posto isso, assim como o que fazemos é evocado e mediado por essa interação, o que sentimos segue esse mesmo processo (Skinner, 1953/2003).

As emoções são eliciadas em nosso corpo a partir de modificações ou estimulações ambientais e, consequentemente, essas podem desencadear mudanças no Sistema Límbico e mediante isso emoções são experienciadas. O Sistema Límbico inclui áreas cerebrais como: amígdala, hipotálamo, hipocampo, dentre outras estruturas, e é o sistema responsável por comunicar “alertas de ameaça” ao organismo (Koons, 2016). Junto a isso, quando alguma estimulação ambiental ativa o Sistema Límbico, esse de imediato aciona outras áreas, são elas: sistema nervoso simpático e parassimpático, modificação da respiração, temperatura e estado de alerta do corpo, ativação do cerebelo (estrutura responsável por controlar os movimentos, tensão muscular e o equilíbrio), dentre outras mudanças que podem ocorrer no organismo como um todo (Koons, 2016).

Diante do exposto talvez você se pergunte: “Lucas por que você está descrevendo tudo isso?”

A descrição acima tem como premissa deixar claro que as emoções são eliciadas mediante a interação entre aspectos biológicos (e.g.: processos evolutivos da espécie e aspectos fisiológicos) e sociais (e.g.: variáveis relacionadas a história de vida do indivíduo, ao ambiente e a cultura que esse integra, etc.) (Caminha, 2014; Skinner, 1953/2003, Linehan, 2018). Ainda, dependendo das interações vivenciadas pela pessoa, alinhado com as suas experiências anteriores, as emoções podem variar em nível de intensidade, duração e, até mesmo, severidade (e.g.: se a expressão emocional acarreta em risco para segurança e integridade da pessoa e/ou de seus pares) (Koons, 2016; Linehan, 2018).

As emoções não são “apenas” respostas fisiológicas e que não possuem importância, podendo, assim, ser evitadas ou bloqueadas. As emoções têm um papel importantíssimo na nossa sobrevivência enquanto espécie, bem como, na nossa interação social (Caminha, 2014). As emoções fazem com que nos sintamos conectados ou não com outras pessoas, auxilia nos processos comunicativos e contribuem para o processo de tomada de decisão (Leahy, Tirch & Napolitano, 2013; Koons, 2016).

“Devido à nossa natureza social, as emoções são uma parte necessária do que significa ser humano. As emoções nos fazem sentir conectados aos outros, nos ajudam a nos comunicar, nos motivam a agir e, literalmente, nos ajudam a sobreviver.” (Koons, 2016)

Os seres humanos nascem com a capacidade de sentir emoções, tal habilidade é fruto do processo evolutivo da espécie. No entanto, é de suma importância que o indivíduo esteja em um ambiente social que lhe ensine e faça a modelação de que forma as respostas emocionais podem ser expressas (Caminha, 2014). Tal descrição traz, novamente, o quão necessário é o contexto na aprendizagem e manutenção de repertórios comportamentais do indivíduo, sejam eles públicos ou privados (Skinner, 1953/2003; Koons, 2016; Linehan, 2018).

Aqui entramos em uma tensão, é de suma relevância que o ambiente ensine a criança a como e quando expressar e modular suas emoções. Todavia, muitos contextos ao invés de ensinar essas habilidades à criança, ensinam-na a reprimir e controlar, veemente, suas experiências e expressões emocionais (Harris, 2011, Koons, 2016). Junto a isso, muitos ambientes punem, pormenorizam e/ou ridicularizam a criança quando essa tenta expressar e modular suas emoções. Diante desses processos é muito frequente que a criança aprenda a não confiar nas suas experiências emocionais, não aprenda a expressar suas emoções de modo assertivo, bem como, regulá-las. Ainda, a criança passa a temer as suas emoções, bem como, categorizá-las em crivos de valores, onde as emoções avaliadas como ruins e negativas devem ser evitadas e, apenas, as emoções positivas e boas devem ser sentidas e expressas (Leahy, Tirch & Napolitano, 2013; Koons, 2016, Linehan, 2018).

Tais aprendizados que ocorrem na infância, e continuam ao longo da vida do ser humano, marcam consideravelmente como a pessoa se relaciona com suas emoções. Além disso, é muito comum que pessoas que possuam esse histórico de aprendizagem apresentam déficits e dificuldades consideráveis para identificar, nomear, regular e expressar suas emoções, assim como, para reconhecer as funções dessas e/ou modular comportamentos que sejam motivados pelas mesmas (Koons, 2016, Linehan, 2018).

O questionamento que pode surgir agora é: “Então, quais as funções das emoções?” e “Existe algum valor no que eu sinto?”

Quais as funções das emoções?

Algumas autoras descrevem que as emoções possuem 3 (três) funções, sendo: 1) Meio de comunicação para informar as demais pessoas como o indivíduo está se sentindo, bem como, para auxiliar na interação do indivíduo com os demais; 2) Comunicar a própria pessoa como ela está se sentindo, assim como, sinalizar indicativos de ameaça ou desconforto emocional (isto é, alertar a si mesmo); e 3) Motivar o indivíduo a agir (Koons, 2016; Linehan, 2018).

De fato muitas pessoas se sentem desconfortáveis com determinadas experiências emocionais e esse processo é totalmente compreensível. As emoções podem ser identificadas como agradáveis e desagradáveis de sentir. Essa identificação não quer dizer que as emoções são boas ou ruins, mas sim que algumas vão gerar conforto e, outras, desconforto ao serem vivenciadas (Caminha, 2014). No entanto, elas precisaram ser sentidas ou expressas de alguma forma, pois nós não conseguimos evitá-las o tempo todo, sejam as emoções consideradas como desagradáveis de sentir ou, até mesmo, as agradáveis. Afinal a vida não é feita apenas de momentos felizes. Situações que fazem com que experienciemos outras emoções nos possibilitam aprendizados, assim como os momentos de alegria (Harris, 2011)

“Existe algum valor no que eu sinto?”

SIM!!!!!! As nossas emoções não surgem do acaso ou do vácuo, o que sentimos é fruto de uma interação entre o indivíduo com ele mesmo e com o contexto/cultura que ele integra. Ainda, as nossas emoções estão intrinsecamente conectadas com a nossa história de vida.

Se uma emoção surge é por que alguma mudança ambiental (ex.: uma conversa, uma imagem, música, discussão com alguém, etc.) ocorreu e ela precisa ser expressa (ou é importante que isso aconteça) (Koons, 2016; Linehan, 2018). Contudo, devido ao hábito que aprendemos de silenciar nossas emoções, acabamos não as comunicando e em, alguns casos, ridicularizamos e invalidamos a nós mesmos por sentir tais emoções (Harris, 2011).

Existem diferentes formas de expressar as emoções, sejam por diálogo ou por meio de alguma expressão artística (ex.: escrita, pintura, desenho, música, etc.). No entanto, algumas emoções podem ser experienciadas de forma intensa e pervasiva, dificultando para que a pessoa tome uma decisão assertiva e, ainda, criando contexto para que a mesma envolva-se em comportamentos que possam trazer risco para a sua integridade e/ou das demais pessoas. Diante desse cenário é importante que a pessoa busque ajuda, a fim de que possa aprender estratégias efetivas para identificar, regular e expressar suas emoções de modo mais diligente, assertivo e que contribua para o fortalecimento da sua relação consigo mesma e dos seus laços com outras pessoas (Leahy, Tirch & Napolitano, 2013; Koons, 2016, Linehan, 2018).

Todavia, é importante pontuar que mesmo tais experiências emocionais possuem valores e funções, visto que as mesmas não chegaram a esse nível por acaso. Descobrir o que contribuiu para todo esse processo, bem como, identificar e implementar estratégias de aceitação e mudança das experiências emocionais e das contingências relacionadas a essas é extremamente importante e irão contribuir consideravelmente para que a pessoa identifique o valor e as funções das emoções, aprenda a como expressá-las e se relacionar com elas de maneira mais assertiva e significativa e que possibilite a experiência e vivência de uma vida que valha a pena ser vivida (Leahy, Tirch & Napolitano, 2013; Koons, 2016, Linehan, 2018).

Quando consistentemente silenciamos tudo aquilo que sentimos, deixamos de perceber o valor que as nossas emoções possuem. Sejam elas desagradáveis ou agradáveis de sentir, as emoções nos ajudam a ser e estar no mundo. Dito de outro modo, nossas emoções auxiliam na maneira com que percebemos as coisas e os fatos, nos motivam a agir e nos auxiliam na nossa interação com outras pessoas e com outros organismos (ex.: animais, natureza, etc.).

Por fim, para que possamos identificar e reconhecer o valor do que sentimos é fundamental praticarmos a postura de não julgamento, isto é, não criticar, pormenorizar, ridicularizar, invalidar e/ou desconsiderar o que estamos sentindo, pois quando julgamos ou pormenorizamos aquilo que sentimos isso muda totalmente a nossa relação com o que acontece dentro e fora de nós.

“A gente acha que nunca mais vai ser feliz,

Mas a solidão não é um ponto final.

Deixe o tempo transformar

O nunca mais em por enquanto.

Só você sabe o que sentiu,

Então só você pode transformar esse vazio

Numa página em branco.”

(Allan Dias Castro, 2019)

Referências

Caminha, R. M. (2014). Educar crianças: as bases de uma educação socioemocional – um guia para pais, educadores e terapeutas. Novo Hamburgo: Sinopsys editora;

Harris, R. (2011). Liberte-se: evitando as armadilhas da procura da felicidade. Rio de Janeiro: Agir;

Koons, C. R. (2016). The mindfulness solution for intense emotions: take control of borderline personality disorder with dbt. Canadá: New Harbinger;

Leahy, R. L., Tirch, D., Napolitano, L. A. (2013). Regulação emocional em psicoterapia: um guia para o terapeuta cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed;

Linehan, M. M. (2018). Treino de habilidade em dbt: manual do terapeuta. 2 ed. Porto Alegre: Artmed;

Skinner, B. F. (1953/2003). Ciência e Comportamento Humano. 11 ed. São Paulo: Martins Fontes.

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Escrito por Lucas Polezi do Couto

- Psicólogo CRP 16/6198 e CRP 08/IS-715;
- Supervisor de intervenções baseadas em ABA para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e quadros associados;
- Mestrando em Psicologia (PPGP UFES);
- Especialista em Psicoterapias Comportamentais de Terceira Geração (IPOG);
- Teacher in Training do Programa Mindfulness e Autocompaixão Mindful Self-Compassion (MSC) (Center for Mindful Self-Compassion & Conectta Mindfulness e Compaixão);
- Pós-graduando em Intervenção ABA para Autismo de DI (CBI of Miami);
- Cursando o preparatório para o QASP-S (The Behavior Web).

Trabalho com Psicoterapia (ACT e DBT), Avaliação Psicológica, Treinamento e Orientação Parental. Apaixonado por ACT, Autocompaixão, ABA, TFC e DBT.

Contato: psicologo.lucaspolezi@gmail.com.

Contingências de reforçamento mediadas: olhando para as nossas interações

𝗪𝗢𝗥𝗞𝗦𝗛𝗢𝗣 – Psicoterapia Focada em Minorias Sexuais e de Gênero. TCC Baseada em Processo e metas transdiagnósticas.