Quando um paciente decide por buscar a psicoterapia, traz consigo queixas e objetivos a serem alcançados. A partir daí já se instaura o desafio do psicólogo clínico, através de um processo de refinamento de tais queixas junto com seu paciente. A descrição trazida para o comportamento tido como problemático costuma vir acompanhada de rótulos ou explicações fatalistas e generalistas. Frases como: “Sempre fui ansiosa”, “Acho que herdei isso da minha mãe”, “Se não fosse o remédio eu já tinha perdido o controle”, “O meu filho só faz coisas para me provocar”, são alguns exemplos de falas que comumente aparecem nos consultórios.
O que chama a atenção nesse processo é que por muitas vezes a descrição do que incomoda e do que não vai bem é mais facilmente levantada pelo paciente do que aquilo que ele realmente busca para a produção e manutenção do seu bem-estar. Ou seja, o bem-estar muitas vezes é atrelado a inexistência ou amenização de desconfortos. Podemos observar isso quando diante de questionamentos como “o que te faz feliz? o que é importante para você? pelo o que você luta a cada novo dia?”, o paciente tende a apresentar respostas voltadas a diminuição de pensamentos ou sentimentos que lhe sejam desagradáveis.
Para entendermos melhor esse processo podemos ampliar o nosso olhar para a sociedade e perceber uma busca continua por bem-estar e felicidade e distanciamento de pensamentos e emoções desagradáveis. Tristeza, medo, preocupação e outras emoções tem sido vistas como sendo algo extremamente negativo e que devem ser evitadas a todo e qualquer custo. Porém, essa luta desenfreada por um bem-estar ininterrupto insere esse indivíduo em um ciclo muito mais permeado pelo passado e pelo futuro, do que pela vivencia do momento presente.
Definida por Skinner como sendo um conjunto de contingencias sociais de um grupo, a cultura tem papel essencial e constitutiva do comportamento humano. Somado a esse processo mais amplo, em suas histórias de vida os indivíduos também tendem a se deparar com modelos, falas e comportamentos que exaltam essa mesma ideia e também são compostos por uma filogênese que apontou que os mais adaptados são aqueles que melhor lutam e fogem dos perigos e que melhor preveem situações aversivos. Diante de todo esse cenário, passamos a encontrar com maior frequência indivíduos muito focados no que não querem, no que não está bom em suas vidas e muito pouco conscientes e consistentes com o que querem, o que buscam e o que é importante para si. Um exemplo prático disso são falas como: “preciso parar de sentir ansiedade”, “eu quero ser menos ciumenta”, “eu queria que meu filho não fosse assim”. Todas essas frases enfocam no que não vai bem, no que está desagradável, no que é preciso eliminar. E se a busca fosse por um melhor bem-estar, um relacionamento mais agradável e por ressaltar características positivas do filho? Não se trata de irmos para o polo extremo oposto, tornando o nosso paciente alguém cegamente otimista. Afinal, a análise do contexto e identificação de perigos potenciais é algo extremamente importante para a nossa proteção.
Muitas dessas percepções são trazidas por terapias de 3ª onda em Psicologia, que visam, dentre tantos outros objetivos, um trabalho mais voltado para aceitação de desconfortos e desagrados e clarificação daquilo que genuinamente é importante para o indivíduo e que pode lhe proporcionar satisfação, bem-estar e qualidade de vida. O foco passa a ser não o que pensamentos e sentimos e como mudar isso e sim o que escolhemos fazer ainda que diante da presença daquele pensamento e daquela emoção.
Referências Bibliográficas
Andery, M.A.P.A. (2011). Comportamento e cultura na perspectiva da análise do comportamento. Perspectivas em análise do comportamento, vol. 2, nº2. São Paulo
Conte, F.C. de Souza. (2010). Reflexões sobre o sofrimento humano e a análise clínica comportamental. Temas em psicologia, vol. 18, nº2. Ribeirão Preto