Um processo de psicoterapia busca promover mudanças ou habilidades no repertório comportamental do cliente que possam ser úteis na lida com determinadas situações de sua vida cotidiana. Para tanto, com base em suas análises, o terapeuta realiza intervenções no contexto de sessão terapêutica para promover aprendizagens ao cliente sobre comportamentos importantes de serem desenvolvidos. Mas, é crucial que as aprendizagens obtidas em sessão também ocorram na vida do cliente, não apenas no consultório do psicólogo, e é neste cenário que as tarefas de casa se destacam como importantes.
As tarefas de casa são mais frequentemente incorporadas na Terapia Comportamental e Terapia Cognitivo-Comportamental, podendo fazer parte de todos as etapas do tratamento. Portanto, ela pode ser atribuída desde a primeira sessão, o que já comunica ao cliente que o processo terapêutico é colaborativo, e que ele tem um papel fundamental no processo de mudança ao realizar algumas atividades em sua rotina entre uma sessão e outra de psicoterapia (Lambert, Harmon & Slade, 2007).
No início do processo psicoterapêutico, as tarefas de casa utilizadas com mais frequência são a psicoeducação e o auto monitoramento. Na psicoeducação, o terapeuta tende a fornecer, como tarefas de casa, materiais psicoeducacionais para o cliente ler a respeito do problema apresentado em sessão, a fim de ensiná-lo sobre a origem dos seus problemas e sobre a abordagem comportamental de tratamento (Ledley & Huppert, 2007).
Por exemplo, no caso de atendimento de crianças ou adolescentes, o terapeuta pode fornecer alguns textos para que os pais leiam, sobre os princípios básicos do comportamento aplicados a educação dos filhos; um bom exemplo deste tipo de leitura é o livro “Eduque com Carinho” da psicóloga Lídia Weber. Seguindo a mesma lógica, leituras ou outros materiais com função de psicoeducação podem ser fornecidos à clientes com queixas variadas, desde que o psicólogo tenha clareza sobre a razão de estar fornecendo este material e desde que selecione um material adequado para a compreensão do seu cliente.
Sobre o auto monitoramento, refere-se a coleta de informações sobre as dificuldades do cliente para facilitar a compreensão dos comportamentos problemáticos e das variáveis que os controlam no contexto de vida diária, contribuindo para o planejamento do tratamento; pode ser utilizado principalmente quando o cliente tem dificuldades para descrever seus comportamentos e eventos em que ocorrem (Ledley & Huppert, 2007).
Um exemplo simples, que pode ser adaptado para a demanda de qualquer cliente, é uma tabela com os dias da semana e períodos por dia – manhã, tarde e noite – em que o cliente registra suas atividades e seu humor respectivo. Assim, o terapeuta consegue algumas informações sobre situações que podem estar relacionadas a queixa e, partir disso, pode explorar exemplos variados dessas situações para realizar análises funcionais, as quais tornarão mais evidentes as variáveis controladoras dos comportamentos problemáticos, e facilitarão ao terapeuta a identificação de comportamentos alternativos e estratégias de intervenção possivelmente eficazes. Ademais, a forma de registro e o que será registrado depende diretamente dos objetivos terapêuticos, o que tornam as possibilidades de auto monitoramento muito variadas, indo além do exemplo exposto aqui.
No início do tratamento, as tarefas de casa costumam ser mais diretivas – por meio da atribuição direta do terapeuta sobre algo a ser feito entre as sessões – mas é recomendado que o cliente seja encorajado a assumir um papel cada vez mais ativo com o progresso do tratamento, para que ele possa aprender a identificar o que pode ser mais relevante fazer durante a semana, entre uma sessão e outra. O desenvolvimento dessa independência do cliente sobre identificar ações importantes pode ser facilitado por meio de perguntas, como: “O que você acha que poderia ser útil para você experimentar fazer esta semana?” (Ledley & Huppert, 2007).
Em momentos posteriores da terapia é mais provável que ocorram tarefas de casa que contemplam técnicas específicas, embora isso não seja uma regra. Assim, a partir do momento em que cliente e terapeuta concordam sobre a análise das variáveis controladoras dos comportamentos problemáticos, técnicas específicas podem ser ensinadas para auxiliar o cliente a emitir comportamentos alternativos (Ledley & Huppert, 2007). Por exemplo, a Terapia Comportamental Dialética propõe algumas habilidades que os clientes podem aprender e treinar em suas vidas, as quais são: atenção plena, regulação emocional, tolerância ao estresse e eficácia interpessoal. Para cada uma delas, exercícios ou atividades podem ser realizados em sessão e na vida cotidiana. No conjunto de habilidades de atenção plena, por exemplo, o cliente pode ser solicitado a praticar em sua semana alguns exercícios de meditação que, em geral, tem como função ensiná-lo a prestar atenção ao momento presente e à experiência imediata (Lineham, 2010).
Por fim, é importante que o terapeuta planeje as tarefas de casa de modo que elas facilitem progressos durante o processo de psicoterapia. Isso quer dizer que o terapeuta pode elaborar metas graduais, começando com a solicitação de comportamentos mais simples e prováveis de serem reforçados ao serem executados, para comportamentos gradualmente mais complexos. Além disso, o terapeuta precisa estar atento na sessão subsequente à execução da tarefa, para lembrar-se de falar sobre ela com o cliente, pois, assim, ele pode salientar ao cliente os efeitos reforçadores da execução do comportamento alternativo, tornando mais provável que ele volte a ser emitido em outros momentos e contextos da vida diária, além de fortalecer a própria resposta de fazê-la. Ademais, o cliente tende a se comprometer mais fortemente com as tarefas de casa quando elas estão diretamente relacionadas ao conteúdo que foi trabalhado em sessão e também aos objetivos de longo prazo na vida diária, ou seja, aquilo que ele almeja na vida por meio da psicoterapia (Ledley & Huppert, 2007).
Em síntese, as tarefas de casa tem um papel importante no processo de psicoterapia, na medida em que criam condições para que o cliente desenvolva auto conhecimento sobre seus problemas ou seus comportamentos, e para que ele experimente, pratique e tenha chance de obter consequências naturalmente reforçadoras para os seus comportamentos alternativos. Neste sentido, é tarefa do terapeuta programar tarefas de casa favoráveis ao progresso do cliente, no sentido de facilitar aprendizagens e melhorias na vida dele.
REFERÊNCIAS
Lambert, M. J., Harmon, C., & Slade, K. (2007). Directions for Research on Homework. In. N. Kazantzis & L. L’Abate. (Eds.), Handbook of Homework Assignments in Psychotherapy: Research, Practice and Prevention. (pp. 407-424). New Jersey: Springer.
Ledley, D. R.; & Huppert, J. D. (2007). Behavior Therapy. In. N. Kazantzis & L. L’Abate. (Eds.), Handbook of Homework Assignments in Psychotherapy: Research, Practice and Prevention. (pp. 19-34). New Jersey: Springer.
Lineham, M. (2010). Terapia cognitivo-comportamental para transtorno da personalidade borderline. Porto Alegre, RS: Artmed.