No meu primeiro texto para o Comporte-se (
leia aqui) falei sobre a distância existente entre a Análise do Comportamento e a vida real. Para ser mais preciso, falei sobre o fato dos princípios comportamentais mais básicos serem totalmente desconhecidos da maioria das pessoas que, interessadas em ter mais qualidade de vida, poderiam se beneficiar consideravelmente desses conhecimentos.
O principal nome do Comportamentalismo, B. F. Skinner repetia incansavelmente em seus livros¹ que a Análise do Comportamento deveria se popularizar, inclusive no vocabulário das pessoas. Isso não aconteceu. Na verdade, o Behaviorismo caiu muito em seus seguidores, praticamente não saiu das universidades e clínicas psicológicas e ainda deu lugar para o crescimento de outras abordagens digamos, menos práticas e mais filosóficas.
Outros autores mais contemporâneos também insistiram na ideia de que o Comportamentalismo e sua filosofia precisavam não apenas ficar mais conhecidas, mas serem descobertas por pessoas de outras áreas e não apenas psicólogos.
Pensando nisso, decidi fazer uma lista de itens do cotidiano e explica-los segundo uma perspectiva comportamental. Não utilizarei termos técnicos (vide explicações do meu texto já mencionado), mas sempre embasado na teoria e prática da Análise do Comportamento.
Política
Quem nunca viu uma pesquisa que dizia que os brasileiros condenam a corrupção, mas que no lugar dos políticos fariam o mesmo? Elas existem aos montes. Outra modinha é dizer que o eleitor é “otário” por ter elegido o corrupto, este considerado um esperto e inteligente. O que essas duas visões bem conhecidas nos dizem? Que a corrupção, a desonestidade e a bandidagem são recompensadoras no Brasil. Os brasileiros condenam a corrupção apenas quando não fazem parte dela – eles percebem que não existem consequências negativas para eles. As punições são mínimas. Não existe modificação de comportamento para pessoas condenadas (elas, no máximo, têm suas liberdades restringidas – e olhe lá!) e é mal falado aquele que insiste em ser honesto, que não passa no sinal vermelho, que devolve o troco errado, que não é agressivo no trânsito, que paga seus impostos sem desvios. Enfim, uma pessoa honesta.
Enquanto a política e a sociedade não recompensarem os bons comportamentos não adianta reclamar que o brasileiro é otário por escolher políticos corruptos – esta classe continuará sendo uma profissão respeitável.
Educação
Temos os piores índices educacionais do mundo. Não gostamos de estudar. Nossas universidades não prestam. O salário dos professores é ridículo. A pesquisa científica é quase nula nas universidades. E então, como resolver? Apesar de achar que o salário dos professores deveria ser melhor, sou uma das poucas pessoas que acredita que isso NÃO melhoraria a educação no Brasil. Ora, apesar do salário ser um dos melhores motivadores, ele é um motivador a longo prazo e que funciona de forma fraca no dia a dia, principalmente quando se está longe de recebe-lo. Motivadores de curto prazo (infraestrutura de qualidade com laboratórios e salas adequadas, material didático de alto nível etc) ajudariam tanto os professores quanto os alunos a se animarem mais para as aulas. Ah! E que a ciência fosse mais valorizada e incentivada enquanto profissão – e que deixássemos de lado empregos “seguros”, porém pouco inovadores e nada científicos como concursos públicos (a febre da brasileirada).
Justiça
Este tópico poderia ser um complemento para “política”, mas merece considerações específicas. O sistema Judiciário brasileiro tem a tendência de prender o mínimo possível e preferir executar penas educacionais. É uma boa ideia, mas o problema está no “educacional”.
Pagar cestas básicas ou fazer trabalho voluntário, muitas vezes sem nenhuma relação com o crime cometido, será mesmo uma medida educacional? O que um condenado está aprendendo com isso? Isso sem falar na boa e velha prisão tradicional. Restringir a liberdade não ensina novos e bons comportamentos – e pode estimular maus comportamentos, haja vista as condições precárias das penitenciárias brasileiras.
Relacionamentos
O homem é um animal social, dizia Aristóteles. Os relacionamentos – sejam profissionais, amorosos, casuais, familiares – são a base da sociedade. Caballo (2006)³ chega a citar uma pesquisa que afirma que a maioria dos casos de depressão, por exemplo, são causados por falta de habilidades sociais adequadas. E quando aprendemos a desenvolver as habilidades sociais?
Só na prática. A repressão a comportamentos agressivos nas escolas (o melhor exemplo é o bullying) chegou tarde nas escolas e também não estimula as habilidades sociais, apenas desestimula o bullying e outras práticas. A mesma pesquisa citada por Caballo também descobriu que a maioria das pessoas possuem dificuldades nessa área.
As maiores críticas ao Behaviorismo em relação a sua aplicabilidade em um contexto maior da sociedade são, principalmente, voltadas para a violação da liberdade das pessoas. Porém, aplicações práticas específicas poderiam ajudar a sociedade (como as mencionadas acima, além de diversas outras) sem exigirem mudanças radicais na sociedade.
E então, vamos começar?
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¹Skinner falou em diversos livros sobre os benefícios que o behaviorismo teria como filosofia aplicável na vida real, alguns desses livros são: Para além da liberdade e da dignidade (Lições 70, 2000), Ciência e comportamento humano (Editora Martins, 2003), Sobre o behaviorismo (Cultrix, 1974) além de diversos outros livros.
²William Baum, que é biólogo, escreveu um dos livros mais importantes para o entendimento do behaviorismo enquanto filosofia, o seu Compreendendo o Behaviorismo (Artmed, 2006)
³CABALLO, Vicente E. Manual de Avaliação e Treinamento das Habilidades Sociais. Editora Santos. São Paulo: 2006.
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