Nosso primeiro encontro: falando de terapia de casal

Por Carolina Perroni

Olá, pessoal.

É com imenso prazer que inauguro mais uma coluna no Portal Comporte-se. A cada dois meses eu irei publicar algum assunto relevante na área de terapia de casal. Antes, permita que eu me apresente.

Meu nome é Carolina Perroni e sou formada em psicologia há algumas décadas. Desde muito jovem, sabia que me tornaria psicóloga, ou arqueóloga, ou uma profissional de letras. Vocês devem ter percebido que um sonho eu realizei.

No segundo ano da faculdade, já tinha escolhido minha linha de preferência: queria ser uma analista do comportamento. A maneira como essa linha entendia o homem e seus problemas me encantava. Depois de me formar, logo comecei o mestrado em “Psicologia Experimental: análise do comportamento” na PUC-SP, pesquisando modelo experimental de depressão. Conheci colegas que me convidaram para trabalhar no Hospital das Clínicas de São Paulo atendendo pessoas com transtorno do controle do impulso, ou seja, pessoas que compravam demais ou apostavam dinheiro em jogos, por exemplo. Eu participava da condução de terapias em grupo e comecei me apaixonar pela área de autocontrole. Atendia pacientes com esse tipo de queixa e, um dia, fiz minha primeira sessão de casal, atendendo um marido que apresentava compulsão por jogos e sua esposa. Essa sessão foi desastrosa. Eu achava que com minha experiência em terapia individual analítico-comportamental conseguiria atender o casal sem grandes problemas. Ledo engano!

Ser terapeuta é uma tarefa hercúlea e ser terapeuta de casal é isso à décima potência. Eu não estava preparada para lidar, ou intervir, ou avaliar questões relativas ao casal. Foi quando comecei a estudar o assunto. Fui morar nos Estados Unidos e fiz o curso sobre o método Gottman de terapia de casal no Gottman Institute. O método Gottman de terapia de casal é fruto de muitas pesquisas básicas feitas por John Gottman e colaboradores antes do início das formulações das propostas de intervenções terapêuticas, criadas por ele em parceria com sua esposa, Julie Gottman. Todo esse trabalho começou há 40 anos e continua em desenvolvimento. Foi esse método – aliado à análise do comportamento que eu já praticava desde a minha formação – que me ajudou a avaliar quais problemas os casais apresentavam e como ajudá-los.

Nessa coluna iriei abordar o método Gottman a partir de alguns temas e um dos temas mais presentes na terapia de casal atualmente é comunicação. A maioria chega à sessão dizendo “nosso problema é comunicação”. Mas o que isso quer dizer? Os parceiros não sabem o que querem? Ou sabem, mas não conseguem comunicar? Ou, ainda, conseguem comunicar, mas o outro não escuta? Ou o outro escuta e não concorda (mantendo, assim, o conflito)?

Temos a resposta para parte do problema. John Gottman, em suas pesquisas, percebeu que casais que não eram felizes ou satisfeitos tinham um jeito particular de comunicar suas necessidades. Quando eles precisavam mostrar insatisfação em relação a algo, eles criticavam descrevendo uma falha na personalidade do(a) seu(sua) parceiro(a). Isso pode ser exemplificado em algumas falas como: “Você é tão preguiçoso(a), toda vez que eu chego em casa a louça está suja”; “você é sempre muito carente”; “você nunca me escuta”. Quando somos criticados, nossa tendência é defender nossa honra criticando o outro ainda mais, ou nos fazendo de vítima. Isso quer dizer que, diante da crítica, nos comportamos de forma defensiva.

Além disso, existe um outro tipo de comunicação que é a pior de todas e que prediz o divórcio: a comunicação de menosprezo. No menosprezo, coloca-se o outro para baixo, assumindo um nível moral mais elevado. Menosprezo é qualquer declaração crítica feita por um dos membros da parceria quando este se coloca em posição de superioridade em relação ao seu parceiro. Em geral, vem acompanhado de atitudes depreciativas como xingar, apelidar, caçoar, imitar, rolar os olhos, cruzar os braços, bufar e condenar a maneira como o outro se comporta.

Há também uma outra situação negativa que acontece quando, durante uma conversa sobre um assunto difícil, um dos membros da parceria, ao se sentir transbordado, deixa de ser participativo e não dá sinais de que está atento ao outro. Cria-se, então, uma parede invisível que impede o engajamento e faz com que o(a) parceiro(a) se sinta abandonado(a) ou, ainda, eleve o tom da voz para ter alguma atenção. Tal situação apenas aumenta a distância entre o casal.

Esses quatro tipos de comunicação – criticismo, ficar na defensiva, menosprezo e emparedamento – são dinâmicas a serem evitadas em sessão e é papel do terapeuta ajudar o casal a encontrar o antídoto. Para evitar o criticismo, por exemplo, é possível conscientizar o casal de que falar da situação em vez de repreender o outro é uma boa saída. Quando um dos membros estiver na defensiva, o terapeuta pode convidá-lo a analisar se há alguma responsabilidade dele em parte do problema. Para dissipar o menosprezo, o terapeuta pode criar uma cultura de apreciação em que o(a) parceiro(a) seja estimulado a perceber onde o outro acerta e dizer a ele. Por último, quando um dos membros se sentir transbordado e desengajado da conversa, o terapeuta pode oferecer ferramentas como interromper a discussão até que os ânimos se acalmem e voltar ao assunto mais tarde.

Há muito ainda o que dizer sobre o papel da comunicação de casal, esse foi um pequeno recorte, um começo de conversa para você me conhecer.

Por fim, o que quero ressaltar é que é possível ser um analista do comportamento e, também, usar o método Gottman de terapia de casal. Essa junção torna rica a análise ao atender um casal e ajuda o terapeuta a intervir para criar uma comunicação verbal efetiva e profícua, ampliar a confiança, a amizade e o afeto, promover diálogo a respeito de problemas que estão estagnados e criar um maior aceitação e entendimento dentro do contexto do relacionamento.

Neste cenário, minha coluna nasce para pensar e refletir acerca desses temas junto com você.

Até!

Referências bibliográficas

  1. Fischer, D. J., & Fink, B. C. (2014). Clinical processes in behavioral couples therapy. Psychotherapy, 51(1), 11–14. doi:10.1037/a003382
  2. Gottman, J.M. & Notarius, C.I. (2000) Decade review: Observing marital interaction. Journal of Marriage and Family. 62:927–947.
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Escrito por carolperroni

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