Pretende-se apresentar a seguir um pouco sobre a Comunicação Não-Violenta (CNV) e algumas questões que fomentam reflexões analítico-comportamentais sobre este tema emergente e que pode ter um relevante impacto nas práticas profissionais de diversas áreas.
Esta metodologia se alinha ao Behaviorismo Radical e as práticas da Análise do Comportamento (AC)?
Tanto a filosofia – behaviorista radical – quanto a sua ciência – Análise do Comportamento (AC) – são amplamente discutidas no Portal Comporte-se e existe vasta literatura sobre seus diversos aspectos. Portanto, os princípios básicos da AC não serão tratados aqui. Mas, se você precisa de uma ajuda para compreender algo, veja o Guia de Leitura de Análise do Comportamento.
A CNV é uma metodologia para comunicação proposta por Marshall B. Rosemberg. Sua principal obra é a primeira fonte de informação sobre este modelo, o qual propõe que podemos melhorar nossas relações interpessoais e profissionais por meio de uma forma de interação honesta e empática (ROSEMBERG, 2006, MARTINOT & FIEDLER, 2016).
Marshall B. Rosenberg foi amigo e aluno de Carl Rogers e, por isto, a CNV possui forte influência do humanismo Rogeriano. A ideia geral por trás da CNV, é que o ser humano tem uma natureza compassiva e que necessita de um contexto favorável para se manifestar.
A partir de experiências pessoais de violência e segregação, o pai da CNV, faz questionamentos comuns a Psicologia: Por que alguns indivíduos, em situações aversivas, mantém-se compassivos, ainda que não deixem de lutar por suas necessidades?
Dos campos de concentração nazista a outras formas de violência, Rosemberg (2006) acredita que a comunicação pode fazer diferença para que as pessoas sejam compassivas. Por isso, a CNV concentra esforços nesta área. Marinot e Fiedler (2016) afirmam que este modelo desenvolve um diálogo cooperativo, compassivo, empático, honesto e que cria intimidade. O procedimento pode ser aplicado em nossa relação conosco, com pessoas ou grupos.
Mas, e para os analistas do comportamento?
O que nos mantém “em contato” com nossos comportamentos benevolentes em situações adversas?
Talvez a primeira pergunta seja – O que é “benevolência”? Para responder, precisamos nos lembrar que os comportamentos verbais devem ser compreendidos com base em sua função e não topograficamente. Além disso, o que em um contexto ou comunidade recebe nome de “benevolência” em outro pode ser seu oposto (SKINNER, 1957).
Uma pessoa enamorada pode dizer a outra “você é um amor” mas o gesto poderia ser “acolhedor”, “carinhoso”, “chantagista”, “dissimulado” ou “irônico”. O termo empregado pela comunidade verbal sempre depende de uma análise cuidadosa do contexto.
Na ciência, por exemplo, treinam-se os indivíduos para definir com precisão cada termo que empregam. Por isso, é importante questionar: o que são a benevolência, compaixão e empatia, tanto para a CNV, que trata os termos como equivalentes, quanto para a AC?
Rosemberg (2006) afirma que a CNV é compassiva porque demonstra-se, por meio dela – respeito, empatia e a aceitação do outro. Isso é, se oferece validação a experiência pessoal das pessoas, o que pode ser vivido como um sentimento de liberdade – “posso ser quem eu sou” – respeito.
Borges e Cassas (2012) falam do sentimento de liberdade como a experiência que descreve um comportar-se que é reforçado positivamente. Quando nos comportamos e somos reforçados desta forma, temos comumente a experiência de liberdade. Então, talvez possamos pensar na proposta de Rosemberg (2006), e no comportamento compassivo, como uma forma de se comportar verbalmente que é reforçadora.
Além disso, a compaixão e empatia, bases da CNV, são muitas vezes descritas como classes de comportamento equivalentes, também na AC. Kanamota (2013) realizou um levantamento sobre definições de empatia e a manutenção das relações interpessoais aparece como função para diversos pesquisadores. Em outras palavras, esta função parece alinhar-se com as propostas de Rosemberg (2006) que objetivam reduzir a distância gerada por uma comunicação alienante.
Zamignani (2007), por sua vez, ao decompor a classe de comportamentos empáticos do terapeuta, oferece informações que permitem afirmar que três dos quatro componentes da CNV são comportamentos empáticos.
Quais são os principais componentes da CNV?
- Descrição de situações sem julgamentos morais;
- Descrição de sentimentos;
- Descrição de necessidades;
- Elaboração de solicitações.
Então, traçadas estas relações preliminares, parece plausível que existem intersecções entre o procedimento da CNV e a visão analítico comportamental. Contudo, é verdade que os comportamentos não podem ser considerados inatos, como propõe Rosemberg (2006), mas sim um repertório desenvolvido ao longo da história do indivíduo e que, segundo Skinner (2003), tem determinantes filogenéticos, ontogenéticos e culturais.
Então, analistas do comportamento podem afirmar que a CNV é um procedimento empático e uma estratégia para lidar com situações aversivas?
É plausível! A CNV pode ser um procedimento com função de minimizar aversivos e também um procedimento de empatia. Mas, atualmente, nem todos os seus componentes são considerados na literatura como empáticos. Exemplos disso são a realização de solicitações e a auto-expressão de necessidades. Além disso, sua função nem sempre envolve reduzir aversivos. Então, ela pode assumir diversas funções, o que inclui, provavelmente, algumas que seriam bastante úteis no setting psicoterapêutico.
O que você acha? Vamos continuar esta discussão em outro artigo?
Até Breve!
REFERÊNCIAS
BORGES, Nicodemos B.; CASSAS, Fernando A. Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos. Artmed Editora, 2009.
KANAMOTA, Priscila Ferreira de Carvalho. Estudo da influência das respostas de empatia e recomendação do terapeuta na interação terapeuta-cliente e descrição de efeitos de um procedimento de intervenção para o tratamento de mães de adolescentes com problemas de comportamento. Dissertação de Mestrado. Bauru: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2013.
MARTINOT, Annegret Feldmann. FIEDLER, Augusto José C B do Prado A importância da CNV – Comunicação Não-Violenta na realização do processo de autoconhecimento.. Revista Educação-UNG-Ser, v. 11, n. 1, p. 58-77, 2016.
ROSENBERG, Marshall B. Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. Editora Ágora, 2006.
SKINNER, Burrhus Frederic. Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
SKINNER, Burrhus Frederic. Verbal behavior. New York: Appleton-Century-Crofts, 1957.
ZAMIGNANI, Denis Roberto. O desenvolvimento de um sistema multidimensional para a categorização de comportamentos na interação terapêutica. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. 2007.