Uma revisão de 148 estudos indicou que relações sociais influenciam a expectativa de vida tanto quanto o tabagismo, alcoolismo, pneumonia, problemas cardíacos, sedentarismo, obesidade, hipertensão e poluição (Holt-Lunstad, Smith & Layton, 2010). Informações semelhantes são apresentadas na ted talk com Robert Waldinger, sobre uma pesquisa que acompanhou a vida de pessoas durante 75 anos, a respeito do que pode tornar uma vida realmente feliz. Robert Waldinger, no vídeo, relata que bons relacionamentos são responsáveis por vidas felizes e mais saudáveis, e descreve três lições sobre relacionamentos: 1) solidão aumenta o risco de morte; 2) a qualidade de relacionamentos é mais importante do que a quantidade de pessoas com quem se relaciona; e 3) relações saudáveis protegem o cérebro, influenciando, por exemplo, a qualidade da memória.
Assim, tanto relacionamentos tóxicos (ou que são problemáticos) como o isolamento social, caracterizado pela ausência de relações íntimas de qualidade e que podem atuar como apoio, são fatores que interferem na saúde e na expectativa de vida das pessoas. Relações sociais saudáveis, então, podem contribuir para reduzir o risco de morte e aumentar a expectativa de vida (Holt-Lunstad, et al., 2010).
O tipo de apoio social possivelmente mais eficaz no aumento da expectativa de vida é o apoio proveniente de relacionamentos naturais, ao invés de relacionamentos com estranhos. As relações naturais são aquelas com familiares, amigos e pessoas da comunidade, enquanto relações com estranhos são aquelas decorrentes de serviços prestados por profissionais da saúde que podem oferecer o apoio e cuidado necessários em situações específicas. Portanto, intervir com foco na promoção de relações sociais naturais e saudáveis pode ser uma alternativa mais pertinente do que o apoio social contratado, exceto nos casos em que o paciente precisa necessariamente deste tipo de serviço (Holt-Lunstad, et al., 2010).
A Psicoterapia Analítica Funcional (FAP) é um modelo terapêutico voltado à melhoria dos relacionamentos sociais do cliente, e que, portanto, parece promover a qualidade dos relacionamentos sociais naturais, isto é, que fazem parte da vida cotidiana dele. Profissionais interessados no tema podem consultar a coluna sobre FAP no Portal Comporte-se, onde textos voltados à prática clínica têm sido apresentados. Este artigo destina-se às pessoas que tem vivenciado dificuldades em suas relações sociais, a fim de orienta-las sobre ações que podem trazer mais qualidade nos relacionamentos.
As orientações são baseadas no modelo ACL da FAP, que significa awareness (consciência), courage (coragem) e love (amor). As três palavras são denominadas como termos de nível médio, por permitirem a comunicação com pessoas que não estão familiarizadas com a linguagem técnica da área.
Consciência
Diz respeito à ação de identificar um comportamento, em que situação ele ocorre e quais são as consequências que ele produz. Nas relações sociais seria o reconhecimento de como a pessoa costuma agir, de situações que influenciam essas ações, e de como essas ações afetam as pessoas com quem ela se relaciona e o relacionamento em si.
Exemplo: Uma pessoa que identifica agir de forma verbalmente agressiva (comportamento), que identifica que ela tende a agir assim quando alguém questiona suas habilidades no trabalho (situação), e que reconhece que afasta seus colegas de trabalho com essas agressões verbais (consequência – impacto nos outros e no relacionamento com os outros).
Coragem
Se refere às situações em que uma pessoa precisa agir diferente no relacionamento, mesmo que isso lhe cause medo ou desconforto. A mudança de ação tem como objetivo melhorar a maneira como ela interage com o outro, ou de lidar sinceramente e diretamente com algum comportamento desagradável do outro, para que mudanças positivas possam ser alcançadas na relação.
Seguindo com o mesmo exemplo: A pessoa, tendo clareza do que desencadeia seu comportamento e das consequências que ele produz, pode desejar agir diferente em prol de melhorias nas relações com seus colegas de trabalho. Nesta situação, uma alternativa possível, é reconhecer sua dificuldade ao colega, pedir-lhe desculpas, e tentar agir de modo diferente a partir de então. Mas, pedir desculpas não é uma ação fácil de ser executada por todas as pessoas. Algumas realmente podem ter medo, principalmente porque a maneira como o outro irá reagir pode ser pouco previsível, isto é, ele pode aceitar ou não o pedido de desculpas. Diante disto, cabe a esta pessoa encorajar-se para pedir desculpas, mesmo que isso lhe cause medo e desconforto, com o propósito de melhorar a maneira como ela lida com questionamentos sobre suas habilidades profissionais e, consequentemente, melhorar a qualidade da relação com seus colegas de trabalho.
Amor
O amor se relaciona à habilidade de ser empático com as dificuldades que o outro apresenta na vida em geral ou nos relacionamentos, ao cuidado com o outro para tratar dessas dificuldades, e à capacidade de reconhecer e dar feedback positivo para os progressos que ele consegue ter sobre a maneira como age nos relacionamentos.
Concluindo o exemplo: A empatia poderia acontecer, por exemplo, ao entender que o outro pode estar chateado o suficiente para não aceitar o pedido de desculpas e mostrar essa compreensão, respeitando a escolha do colega; e poderia acontecer também antes do pedido de desculpas, na medida em que a pessoa entende que o outro se afastou por ter se chateado com as agressões verbais, o que tenderia a motivar o seu pedido de desculpas. A empatia também poderia estar presente na ação do colega, se este for compreensivo com a dificuldade que a pessoa tem em aceitar críticas, ou se este for compreensivo com a coragem que a pessoa teve para reconhecer seu erro e agir diferente pedindo desculpas, fornecendo, então, um feedback positivo sobre esse comportamento de melhora.
Em síntese, a sugestão da FAP é que as pessoas desenvolvam: 1) mais consciência sobre a relação de suas ações com as situações de suas vidas; 2) mais coragem para agir diferente em busca de melhorias na forma pessoal de agir nas relações e em busca de melhorias nas relações propriamente ditas; 3) e mais cuidado, respeito, empatia e compreensão, tanto com as dificuldades como com as tentativas de progresso ou mudança do outro.
Esses três pontos parecem simples, mas na prática são permeados por peculiaridades que tornam o caminho nem sempre fácil. Mas são pontos que podem servir como guias para aqueles que buscam se desenvolver e ter relacionamentos mais satisfatórios, com mais proximidade, respeito, conexão e intimidade.
Referências
Camoleze, M. (2016, Setembro 5). FAP – o modelo ACL e a mudança de comportamentos na vida do cliente. Obtido de https://comportese.com/2016/09/fap-o-modelo-acl-e-a-mudanca-de-comportamentos-na-vida-cliente
Holt-Lunstad, J., Smith, T. B., & Layton, J. B. (2010). Social relationships and mortality risk: a meta-analytic review. PLoS Med, 7(7), e1000316.
Passos, J. A. F. (2016, Novembro 22). Mais amor por favor – Uma análise comportamental do Amor. Obtido de https://comportese.com/2016/11/amor