Entrevistado: prof. Thomas Sean Higbee[1]
Entrevistador: Arthur Damião Médici
Segunda feira, 18 de julho de 2011, 13:00.
A entrevista abaixo foi conduzida com o prof. Dr. Thomas Higbee, que é Professor Associado do Departamento de Educação Especial e Reabilitação da Universidade Estadual de Utah, onde trabalha desde 2002. Ele também é diretor do programa Servicos de Apoio para Autismo: Educação, Pesquisa e Treinamento (ASSERT), um serviço de intervenção comportamental precoce intensivo para crianças com autismo que fundou em 2003. O Dr. Higbee é Board Certified Behavior Analyst (BCBA-D) em nível de doutorado e publica pesquisas, bem como apresenta palestras, em conferências estaduais e nacionais sobre tópicos relacionados a estratégias de avaliação e intervenção comportamental para indivíduos com autismo e outras situações de desenvolvimento atípico. Ele é atualmente Editor Associado do Journal of Applied Behavior Analysis (JABA) e realizou ações no quadro de editores do Behavior Analysis in Practice, bem como do JABA. Por meio de workshops e consultas ele treina professores e prestadores de serviço relacionados em escolas pelo oeste dos Estados Unidos. A entrevista abaixo tem por objetivo apresentar o que é o autismo e como o Dr. Higbee tem utilizado as ferramentas proporcionadas pela análise do comportamento e seus procedimentos de pesquisa para o tratamento desta condição.
Arthur Médici entrevistando o prof. Dr. Thomas Higbee |
O que é a educação especial e o que ela tem de diferente da educação regular?
Educação especial, nos Estados Unidos, é o arranjo de serviços educacionais suplementares ou alternativos para estudantes que não estão apresentando progresso em situação regular de ensino. A principal diferença é que o currículo e as estratégias instrucionais utilizadas para estudantes que qualificam para serviços de educação especial são mais individualizadas para se adequarem às necessidades educacionais de cada aluno. A diversidade de serviços oferecidos para estudantes sob o guarda-chuva da educação especial é bastante amplo.
Como a análise do comportamento pode contribuir com a educação especial.
A análise do comportamento contribuiu e continua contribuindo para o campo da educação especial. Muitas das mais bem sucedidas técnicas de intervenção são baseadas nos princípios da análise do comportamento. Estratégias como “dicas”, “modelagem”, “esvanecimento” e “reforçamento diferencial” são todos utilizados no campo da educação especial como um todo no ensino de indivíduos com necessidades especiais. Técnicas desenvolvidas pela análise do comportamento também são práticas corriqueiras com alunos que apresentam comportamentos problema.
O que é a análise do comportamento e como esta ciência vem mudando ao longo do tempo?
A análise do comportamento é uma ciência natural cujo assunto de interesse é o estudo do comportamento e dos fatores ambientais que o produzem/ocasionam. Eu não diria que a ciência em si está mudando muito ao longo do tempo uma vez que os princípios básicos que explicam o comportamento humano são bem compreendidos por grande parte. A excessão pode ser o comportamento verbal e cognição como a teoria dos quadros relacionais (relational frame theory). O que está constantemente mudando, entretanto, é como estes princípios básicos são aplicados para melhorar a condição humana. O campo da análise aplicada do comportamento está crescendo rápido e é muito mais proeminente do que era no passado. Muito desta expansão ocorreu na área do autismo e desenvolvimento atípico mas os avanços também ocorreram em outras áreas como a psicoterapia, segurança no trabalho e comportamento organizacional.
Gostaria que você falasse um pouco o que é o autismo, como lidar com indivíduos com autismo e o que motivou seu trabalho com esta população.
Autismo é uma situação de desenvolvimento atípica severa, que afeta os indivíduos em graus variados em três áreas principais: 1) comunicação; 2) comportamento social; e 3) comportamentos estereotipados e outros considerados desafiadores. O autismo consiste em um “espectro”, o que significa que afeta indivíduos de diferentes formas em graus variados de severidade. Não há causas conhecidas do autismo, entretanto pesquisas recentes sugerem que há origens tanto genéticas quando ambientais. Eu tive contato com indivíduos com autismo em meu programa de doutorado quando eu tive a oportunidade de trabalhar como um instrutor de crianças com autismo. Eu fiquei fascinado com o fato de que cada indivíduo com autismo é único e também com o fato de que, por meio de intervenção apropriada, muitas crianças com autismo podem progredir significativamente.
Como a análise do comportamento pode contribuir com o ensino de habilidades de indivíduos com autismo?
Analistas do comportamento sabem como entender por que o comportamento está ou não está ocorrendo e arranja contingências de reforçamento para promover comportamentos adequados e inibir comportamentos inadequados. Analistas do comportamento têm trabalhado com indivíduos com autismo desde os anos 1960. A abordagem analítico comportamental para o tratamento de indivíduos com autistmo tem sido pesquisada mais do que qualquer outra abordagem e tem consistentemente produzido bons resultados. Analistas do comportamento utilizam seu conhecimento sobre contingências de reforçamento para ensinar comportamentos adequados e inibir comportamentos inadequados e utilizam suas habilidades de coleta e análise de dados para determinar se forem bem sucedidas e realizar modificações em seu tratamento se não forem.
Qual a importância e as limitações da pesquisa básica para o ensino de indivíduos autistas?
Eu acredito que ainda há muitas questões importantes de pesquisa básica a serem respondidas que apresentam relevância para o ensino de indivíduos com autismo. Perguntas que levam em consideração o uso de dicas e técnicas de esvanecimento de dicas, estratégias para o ensino de discriminações condicionais, e estudos mais complexos sobre fenômenos comportamentais como ressurgência, resistência à extinção, todos tem relevância para o autismo. O truque é fazer com que pesquisadores de pesquisa básica se interessem por essas questões que têm relevância direta para o tratamento.
Qual a importância e as limitações da pesquisa aplicada para o ensino de indivíduos autistas?
Também há muitas perguntas de pesquisa aplicada que ainda precisam ser respondidas. Algumas delas são relacionadas a técnicas específicas de ensino como “qual dica ou estratégia de correção de erro deve-se utilizar com qual aluno”. Também há outras áreas como “estratégias para promover comportamentos sociais” que podem se beneficiar com muito mais pesquisas.
Gostaria que você falasse sobre o que é a ASSERT, suas principais atividades de ensino e pesquisa e como é feito o envolvimento de outras pessoas no processo (pais, parentes…).
ASSERT, que significa Servicos de Apoio para Autismo: Educação, Pesquisa, e Treinamento (Autism Support Services: Education, Research, and Training) é um programa para crianças em fases iniciais do desenvolvimento (de 3 a 5 anos) com autismo e suas familias que criei em 2003.
O seu grupo de apoio (staff):
· Providenciar intervenção educacional e comportamental precoce efetiva para crianças com autismo;
· Conduzir pesquisas para melhorar intervenções educacionais e comportamentais para crianças com autismo;
· Operar uma sala de aula modelo para treinamento para profissionais de educação da região oeste dos EUA.
Eu iniciei a ASSERT por que havia uma demanda significativa na comunidade. Havia muitas famílias de crianças com autismo que não tinham acesso a tratamento efetivo. ASSERT também funciona como um laboratório de pesquisa para mim e para meus alunos de pós graduação. Nós investigamos novas formas de avaliação e estratégias de tratamento para ajudar crianças com autismo e suas famílias.
A ASSERT utiliza a abordagem da análise do comportamento para o tratamento de crianças com autismo. Cada estudante do programa recebe 20 horas semanais de instruções 1 para 1 (em que cada aluno recebe instruções de um professor individualmente) de alunos de graduação da USU (Universidade Estadual de Utah). O currículo de cada um dos alunos é programado individualmente para atender necessidades educacionais e comportamentais específicas.
O currículo de cada aluno é monitorado por um aluno de doutorado (chamado administrador de casos – case manager) que é responsável por assegurar que os alunos de graduação implementam o plano educacional com fidelidade. Nós também providenciamos treinos para famílias no programa e consultas domésticas mensais para ajudar famílias a lidar com problemas de comportamento em casa e encorajar seus filhos a se comunicarem apropriadamente.
A ASSERT também funcionam como um sítio de treinamento para professores de educação especial atuais e futuros. Nós também construimos salas de aula da ASSERT em diferentes localidades do estado de Utah para que estudantes em outras localidades possam receber intervenções educacionais apropriadas.
Qual é a importância de vincular a pesquisa ao trabalho de organizações como a ASSERT?
Como um analista do comportamento, é essencial para mim que nós utilizemos apenas estratégias de tratamento que são baseadas em pesquisas clinicas publicadas. Isto nos concede as melhores chances de sucesso com nossos alunos. Nós também trabalhamos bastante para desenvolver pesquisas que vão beneficiar, não apenas nossos alunos, mas alunos com autismo de diversas regiões do mundo.
[1] Esta entrevista não deve ser reproduzida sem autorização prévia do autor. Para maiores informações, envie um email para arthur.medici@gmail.com