A vida de B.F. Skinner Parte XIII: Os últimos anos de Skinner

Este é o décimo terceiro e último artigo de uma série que discute a vida de Burrhus Frederic Skinner. Recomenda-se que o leitor interessado leia os artigos anteriores disponibilizados pelo Comporte-se, para que consiga compreender melhor o texto. Quem é o homem por trás da teoria que inspira tantas pessoas até hoje? O objetivo desta série é reconstruir o caminho percorrido por Skinner, apontando aspectos de sua vida pessoal que determinaram seu comportamento e, consequentemente, o de muitos outros. Espera-se que esta narrativa possa não apenas cativar o leitor, mas também tornar natural e humano aquilo que mais nos fascina.

Após os anos de assédio midiático e acadêmico que levaram Skinner a aposentadoria em 1974, especialmente fruto de seu livro Beyond Freedom and Dignity (1971), o autor começou a sentir os efeitos da exaustão e da velhice. Em 1974 ele foi diagnosticado com um problema cardíaco, o qual segundo o seu médico, um terço dos pacientes não sobreviviam mais do que 5 anos (Bjork, 1997). Com ajuda de Eve e Julie, Skinner passou a controlar sua alimentação, visando recomendações médicas de redução do colesterol. Além disso, Skinner experienciou uma redução na sua capacidade auditiva, algo que era especialmente perturbador para um amante de música como ele. Ao longo da década de 70, Skinner também começou a ter problemas de visão: seu olho esquerdo não servia mais para ler de perto, e foi diagnosticado com glaucoma no olho direito. Com medo de ficar cego, Skinner pediu conselho de seu médico sobre o uso de maconha para o tratamento do glaucoma. O médico desaconselhou o uso de maconha, devido aos problemas cardíacos do paciente (Bjork, 1997).

Diante destes problemas de saúde que colocavam dificuldades à sua vida cotidiana, Skinner fez o que pregou em toda sua vida: arranjou seu ambiente de forma que seu comportamento se tornasse mais efetivo. Para seu problema de audição, Skinner desenvolveu um aparelho, carinhosamente apelidado de “orelhas do Mickey mouse”, que amplificavam as ondas de som saídas de seu rádio. Além disso, Skinner continuou a manter uma rotina na qual sempre reservava um tempo de pelo menos uma hora por dia para tocar seu clavicórdio ou piano. Caso perdesse totalmente sua visão, Skinner planejava se especializar em música, “transferindo o controle de estímulos visuais para estímulos auditivos enquanto sigo os mesmos interesses” (Skinner, 1983a).

Dessa forma, Skinner conseguiu, apesar de todas as dificuldades, manter-se ativo e ser reforçado por isso. A partir de uma coletânea de artigos a palestras, Skinner publicou três livros: Reflections on Behaviorism and Society (1978), Upon Further Reflection (1987) e Recent Issues in the Analysis of Behavior (1989). Além destas obras, Skinner também foi coautor de um livro intitulado Enjoy Old Age (1983b), um guia prático para pessoas idosas arranjarem seu ambiente de forma que suas contingências de reforçamento positivo não fossem aplacadas pela velhice.

Skinner em sua casa, final da década de 80.

Esta produtividade impressionante foi possível, dentre outros fatores como o autogerenciamento proposto por Skinner (1983b), graças à estrita rotina estabelecida pelo autor: ao seu relógio soava à meia noite e então ele despertava, ia para sua escrivaninha e escrevia até o relógio tocar a uma hora da manhã. Seguia dormindo até às cinco horas da manhã, quando se despertava e escrevia até às sete horas. O resto do dia, Skinner se dedicava a atividades como música, jardinagem, leitura, correspondências, visitas e tardes à beira da piscina acompanhado de familiares e uma vodca com tônica (Bjork, 1997).

Em 1981, Skinner foi diagnosticado com um tumor cerebral maligno. O tratamento de radioterapia foi iniciado imediatamente e foi relativamente bem-sucedido, prolongando a vida do autor e mantendo uma boa qualidade de vida, apesar dos enjoos ocasionais. Em 1987, Skinner escorregou enquanto descia as escadas para o seu escritório no porão e bateu a cabeça nos degraus da escada. Ele sofreu um hematoma subdural que quase custou sua vida. Depois de quase um ano entrando e saindo do hospital e duas cirurgias ele estava de volta à sua rotina, aos 83 anos de idade. Skinner já sentia que suas capacidades intelectuais não estavam tão preservadas como antigamente, escrever era cada vez mais difícil e ele frequentemente errava a ortografia de palavras simples.

Segundo o relato de Bjork (1997), em 1989, enquanto estava acompanhando sua esposa que estava tratando de uma embolia, Skinner desmaiou. Os médicos o internaram e fizeram diversos exames. Na manhã seguinte ao chegarem no quarto de Skinner, foram questionados antes que pudessem lhe dar a notícia “Vocês vão me dizer que eu tenho câncer, não é? Quanto tempo eu tenho?”. Os médicos o diagnosticaram com leucemia e responderam que ele tinha de seis meses a um ano de vida. Skinner disse que não sentiu a menor ansiedade de receber a notícia, a única preocupação dele era com a mulher e as filhas, em especial Deborah, que havia chorado por uma tarde toda quando o gato da família morreu. A leucemia em seu último ano de vida, implicou que a cada oito dias ele tivesse que fazer uma transfusão de sangue completa, um procedimento que tinha duração de 11 horas. Além disso, tinha que ir cuidar do nível de plaquetas no hospital a cada 4 dias, onde passava de quatro a cinco horas por visita.

Oito dias antes de sua morte Skinner recebeu a Menção Honrosa da Associação Americana de Psicologia pela Notável Contribuição à Psicologia ao longo de sua vida. Skinner deu um discurso de 20 minutos para uma plateia que ouviu seu discurso em pé, sem recorrer a qualquer anotação. O vídeo dessa palestra pode ser conferido aqui.

Oito dias depois, já muito enfraquecido pela leucemia, Skinner recusou as últimas tentativas de prolongar sua vida por mais algumas horas e faleceu. Citando Getúlio Vargas, saiu da vida para entrar na história.

Referências

Bjork, D. W. (1997). B.F. Skinner: A life. Washington, DC, US: American Psychological Association.

Skinner, B. F. (1983a). A matter of consequences: Part three of an autobiography. New York: Knopf.

Skinner, B. F., & Vaughan, M. E. (1983b). Enjoy old age: A practical guide. WW Norton & Company.

Skinner, B. F. (1978). Reflections on behaviorism and society. New York: Knopf.

Skinner, B. F. (1987). Upon further reflection. New York: Knopf.

Skinner, B. F. (1989). Recent issues in the analysis of behavior. Columbus: Merrill.

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Escrito por Cainã Gomes

Formado em Psicologia pela PUC-SP e especialista em Clínica Analítico-Comportamental. É pesquisador do Paradigma - Centro de Ciências do Comportamento, onde também atua como terapeuta. Tem experiência na área de Análise do Comportamento, com ênfase com Comportamento Governado por Regra e RFT (Relational Frame Theory). Foi coordenador da Comissão de História de Análise do Comportamento da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC) na gestão 2015-2016. Além disso, é mestrando do programa de Psicologia Experimental: Análise do Comportamento da PUC-SP com período sanduíche na Universidade de Gent, sob orientação do Prof. Dermot Barnes-Holmes. Está cursando o Intensive Training em DBT do Behavioral Tech, Linehan Institute.

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