O ano de 2016, foi marcado pelas Olimpíadas e Paraolimpíadas no Rio de Janeiro. Além de um forte crescimento de mídia e público, outras modalidades esportivas não tão tradicionais passaram a ter mais espaço nas mídias especializadas, tal como os esportes eletrônicos ou e-sports.
Tanto nas olimpíadas, quanto nos esportes eletrônicos, o papel de psicólogos do esporte foi muitas vezes apontado como um fator que contribuiu para o desempenho esportivo dos envolvidos em tais eventos, em conjunto a toda comissão técnica de um time ou atleta. Com isso o mercado esportivo abre cada vez mais espaço para o trabalho do psicólogo do esporte. E, atualmente, o mercado de cursos livres ou de pós-graduação em psicologia do esporte também se mostra em expansão. Porém, como o profissional recém-formado, ou que pretende mudar de área de atuação dentro da própria psicologia, pode ingressar nessa área de atuação?
No livro Consultoria em psicologia do esporte: orientações práticas em análise do comportamento, Garry Martin dedica um capítulo exclusivamente a como o recém-formado pode ingressar no mercado de Psicologia do Esporte. As dicas vão desde noções básicas de como se inserir no contexto do esporte até noções de marketing e divulgação de serviços.
Preparação preliminar e treinamento:
Conhecimento detalhado sobre o ambiente esportivo: O ambiente esportivo, do ponto de vista dos que são observados, é uma cultura à parte. Seu funcionamento difere de outros ambientes. Tipos de relações interpessoais de trabalho, hierarquia, mídia e atletas constituem esse ambiente diferenciado. Times e staff podem mudar completamente a cada temporada, e, ao mesmo tempo que algumas regras podem se manter rígidas e imutáveis, outras podem se alterar constantemente, exigindo do profissional estar constantemente atento ao que acontece no contexto do esporte.
Conhecer a fundo uma ou mais modalidades; conhecer a tal estratégia permite compreender como e porque ela está estruturada naquele momento. Além de questões técnico – táticas, conhecer o macro funcionamento permite compreender o que controla o comportamento dos envolvidos no contexto.
Muitas horas de trabalho voluntário: O trabalho voluntário pode dar chance de observar o mais básico de qualquer modalidade ou clube esportivo. Não somente o contato com atletas e técnicos, mas aqueles que fazem uma instituição esportiva funcionar, dos prestadores de serviços ao responsável pela manutenção de um centro de treinamento e etc.
Categorias de base: Como o próprio nome diz, é a base do início da carreira de um atleta. Geralmente nas categorias de base se encontram crianças ou pré-adolescentes que entraram no esporte por meio de projeto social, por influência da família ou para reabilitação/ promoção de saúde. Atletas profissionais podem ter iniciado no esporte por um destes modos e pode ser de grande valia entender como o ambiente de um atleta profissional foi se constituindo.
Comunicação constante com atletas, pais, treinadores: No meio esportivo a comunicação constante com treinadores e família, além dos atletas, claro, demonstra que o profissional está sempre presente e disposto a esclarecer dúvidas, explicar procedimentos e o modo de trabalho.
Chegar antes e sair depois dos treinos; Como os atletas se preparam para um dia de treino ou como encerram as atividades diárias pode dar dicas de como se preparam para o dia de trabalho/treinos e o que fazem após os períodos de treinos.
Aproximar-se de pessoas que “fazem” o esporte no geral: pessoas que fazem o esporte acontecer não são apenas atletas e técnicos. Por trás das pessoas que recebem a atenção da mídia, como citado nos itens anteriores, há toda uma estrutura e entender os detalhes dessa estrutura pode ser o diferencial na hora de uma entrevista ou demonstrar para um atleta que você sabe o que faz e onde está inserido.
Acompanhar competições; A presença nas competições permite ao profissional ter mais informações sobre como comportamentos de técnicos, atletas e torcedores se relacionam e o tipo de influência que pode exercer no desempenho dos profissionais, sendo informações de grande valia para futuras intervenções.
Estudar as modalidades: Caso a modalidade que se pretenda trabalhar não seja tão conhecida pelo psicólogo é fundamental estudar e compreender as regras, não só regras do jogo em si, mas as regras sociais que regem determinada modalidade. Ao explicar seu trabalho ou uma intervenção o fato de demonstrar conhecimento sobre como e onde estão sendo aplicados os conhecimentos da psicologia do esporte pode ser a linha entre ter a confiança de técnicos e atletas ou ser visto como alguém que não passa confiança e segurança no que faz.
Preparando a descrição de seus serviços e de sua abordagem
Compreender as exigências específicas: Talvez algo que não esteja tão claro para profissionais que pretendem ingressar na psicologia do esporte, que não tenham tido experiência esportiva em outros contextos da sua vida, é a noção do tipo de exigência específica para diferentes modalidades. Modalidades de grupo diferem de modalidades individuais. E não só isso, há modalidades em grupo que o tipo de foco, concentração e ativação fisiológica diferem de uma para a outra. Já em modalidades individuais, modalidades de lutas, por exemplo, exigem do atleta um tipo de repertório diferente de atletas, comparadas a outras modalidades que o necessário seria melhor controle de atenção e um baixo nível de ativação fisiológica.
Aprender a linguagem de cada uma: Como já citado anteriormente, aprender os jargões e linguagens específicas das modalidades que se pretende trabalhar pode ser o fator decisivo para ingressar na equipe após uma entrevista com técnicos e atletas. Ao demonstrar conhecimento do “idioma” da modalidade se demonstra conhecimento sobre o que está sendo dito e faz com que o profissional não seja visto como um estranho que não tem domínio ou noção do que faz naquele ambiente.
Interpretar as modalidades e exigências teoricamente: O processo de aprendizagem é o objeto de estudos de nós, analistas do comportamento. A própria análise do comportamento em seus primórdios era conhecida como a psicologia da aprendizagem. Ao interpretarmos o modo como uma modalidade funciona e como os comportamentos táticos e técnicos são instalados e mantidos podemos pensar em quais serão ferramentas de intervenção da psicologia do esporte, e quais podem ser utilizadas com mais ênfase na demanda e repertório necessário para o bom desempenho esportivo. Explicar as modalidades e exigências de forma acessível: Toda relação de trabalho é fortalecida pelo entendimento e troca de informações entre os profissionais e também aqueles que são leigos em determinados assuntos. Na psicologia do esporte não é diferente. Quando o profissional tem a habilidade de interpretar as exigências das modalidades teoricamente se torna mais fácil explicar aos leigos, atletas e técnicos o que faz. Vínculos profissionais se fortalecem e pode ser maior a confiança que técnicos e atletas tem no profissional da psicologia do esporte.
O repertório necessário ao psicólogo do esporte vai além do conhecimento teórico e relatos de prática apresentados em artigos e livros. Talvez, esses sejam os pontos com menos dificuldade, já que bons materiais são facilmente achados na internet. A dificuldade atualmente está em explicar como é aplicado o trabalho nas diversas modalidades esportivas existentes, demonstrar ao contratante por que o seu trabalho pode ser efetivo e como as demandas estão sendo superadas. Isso não implica em afastamento da teoria em prol das habilidades de relação com o cliente. Implica em dominar tão bem a teoria a ponto de poder compreender de modo amplo como todo o sistema complexo funciona e qual a posição que o profissional ocupa neste recorte do ambiente esportivo, suas responsabilidades para com o público leigo e como isso influencia a sua área de atuação e a comunidade de psicólogos do esporte. Quanto melhor os psicólogos do esporte representarem a área frente aos principais interessados, maiores são as possibilidades de que o interesse se multiplique, levando a psicologia do esporte a um nível maior de entendimento por parte do público em geral.
Referências
Martin, G. L. (2001). Consultoria em psicologia do esporte: orientações práticas em análise do comportamento. Campinas, SP: Instituto de Análise do Comportamento.