Relações interpessoais são essencialmente humanas, por isso, problemas interpessoais são muito comuns e estão presentes em desordens como ansiedade, depressão e outros problemas psiquiátricos. Nestes casos, terapias que buscam promover relacionamentos em que existe conexão ou aliança entre as pessoas, frequentemente produzem melhorias nos casos clínicos. Assim, a Psicoterapia Analítica Funcional (FAP) é um modelo terapêutico que busca promover essa conexão social tanto na relação entre terapeuta e cliente como nos relacionamentos da vida diária do cliente, baseando-se nos aspectos de consciência, coragem e amor (Haworth, Kanter, Tsai, Kuczynski, Rae & Kohlenberg, 2015).
Consciência, coragem e amor constituem-se no modelo ACL da FAP – awareness (A), courage (C), love (L) – que parte do princípio de que o terapeuta não deve ter apenas a habilidade de analisar intelectualmente, mas também a habilidade de se expor conscientemente, corajosamente e amorosamente para promover as melhorias almejadas para o cliente, inclusive porque essas melhorias demandam que o próprio cliente também desenvolva tais habilidades (Tsai, McKelvie, Kohlenberg & Kanter, 2014).
Figura 1. Tradução do modelo clínico da FAP de conexão social de Haworth et al. (2015)
Em outras palavras, em um modelo ACL (Figura 1) o terapeuta deve estar atento e consciente aos comportamentos do cliente (Consciência) para, então, intervir de modo a evocar deste cliente um comportamento vulnerável de autorevelação (Coragem), e responder contingentemente de forma natural, genuína e afetuosa, a fim de reforçar este comportamento (Amor), facilitando a promoção de intimidade, proximidade e conexão (Haworth et al, 2015).
A mudança, então, começa no ambiente de consultório por meio da evocação de comportamentos alternativos e pelo reforço natural e diferencial deles, e se transpõe para a vida diária do cliente por meio das similaridades funcionais entre os eventos ocorridos em sessão terapêutica e eventos ocorridos no contexto extra-sessão. Isso quer dizer que o cliente passa a emitir os comportamentos aprendidos em terapia, nas situações do seu cotidiano em que a função desses comportamentos seria a mesma (Tsai et al., 2014, Ferro-García, Valero-Aguayo & Bermúdez, 2016).
Esse processo de transposição dos comportamentos aprendidos em sessão para o contexto de vida diária do cliente, por meio de similaridades funcionais entre os eventos de cada contexto, está fundamentado nos conceitos de equivalência funcional e transferência de função. A equivalência funcional ocorre quando as variáveis de controle de um comportamento são funcionalmente semelhantes em dois ou mais contextos, por exemplo, uma pessoa que em sua história foi submissa ao pai, pode comportar-se de forma submissa com o terapeuta e com outras pessoas que, de alguma forma, lhe pareçam ter a função de exercer alguma autoridade. A transferência de função ocorre quando a função de um comportamento é a mesma em dois ou mais contextos, continuando com o exemplo, a mesma pessoa pode aprender a se posicionar assertivamente com o terapeuta para obter uma determinada consequência, e passar a emitir comportamentos funcionalmente semelhantes em outros contextos também, como com o pai. Assim, o que generaliza não é a propriedade física de um evento, mas a função (Ferro-García et al., 2016).
Essas similaridades funcionais podem ser ressaltadas ao cliente por meio do fornecimento de análises de contingências a respeito do seu comportamento, por meio da modelagem dessas análises de contingências em seu repertório verbal – tornando-o capaz de identificar o contexto antecedente e consequente em que seus comportamentos ocorrem e são passíveis de reforço – e por meio de paralelos funcionais (Abreu, Hübner & Lucchese, 2012). Em um modelo ACL, isso implica em o cliente estar consciente de oportunidades de conexão social, que facilitarão a ocorrência do comportamento de auto revelação que poderá gerar consequências relacionadas ao aumento de intimidade (Haworth et al., 2015).
Em síntese, a FAP se fundamenta na análise de contingências envolvidas nos comportamentos do cliente que são emitidos em sessão terapêutica – inclusive análises do comportamento verbal, a fim de identificar qual a função de determinados comportamentos verbais do cliente na relação com o terapeuta –, nas contingências de reforço natural, na modelagem de comportamentos-alvo, e na equivalência funcional entre eventos do contexto clínico e eventos da vida diária do cliente (Ferro-García et al., 2016).
REFERÊNCIAS
Abreu, P. R., Hübner, M. M. C., & Lucchese, F. (2012). The role of shaping the client’s interpretations in functional analytic psychotherapy. The Analysis of Verbal Behavior, 28(1), 151. Retirado de http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3363406/
Ferro-García, R., Valero-Aguayo, L., & López Bermúdez, M. Á. (2016). Fundamentos, características y eficacia de la Psicoterapia Analítica Funcional. Análisis y Modificación de Conducta, 42(165-166), 51-73. Retirado de http://www.uhu.es/publicaciones/ojs/index.php/amc/article/viewFile/2794/2539
Haworth, K., Kanter, J. W., Tsai, M., Kuczynski, A. M., Rae, J. R., & Kohlenberg, R. J. (2015). Reinforcement matters: A preliminary, laboratory-based component-process analysis of Functional Analytic Psychotherapy’s model of social connection. Journal of Contextual Behavioral Science. 4, 281-291. http://doi.org/10.1016/j.jcbs.2015.08.003
Tsai, M., McKelvie, M., Kohlenberg, R. & Kanter, J. (2014, Dezembro). Functional Analytic Psychotherapy: Using Awareness, Courage and Love in Treatment. Society for the Advancement of Psychotherapy. Retirado de http://societyforpsychotherapy.org/functional-analytic-psychotherapy-fap-using-awareness-courage-love-treatment/