Relação terapêutica: O vínculo que modela e constrói mudanças

Falar de relação terapêutica é sinônimo de olhar de perto para uma interação que será fundamental para o bom andamento clínico. Esse é um dado que já é marcadamente conhecido e catalogado em inúmeras pesquisas, porém, é preciso ressaltar que tão importante quanto estar ciente, é preciso saber como criar tais alianças tão poderosas.

É essa construção de vínculo que trará a possibilidade de sucesso de qualquer intervenção escolhida, pois nenhuma técnica pode pressupor a interação entre terapeuta e paciente.

Quando nos referimos a Terapia de aceitação e compromisso (ACT) “ a relação terapêutica é tanto um modelo dos processos de flexibilidade psicológica quanto um meio pelo qual eles são construídos” (Luoma, Hayes & Walser, 2022, pág. 335). Ou seja, uma relação terapêutica forte traz em si os elementos do hexaflex, tais como aceitação, não julgamento, consciência, momento presente e um contato com valores e ações de compromisso.

Na visão da ACT, terapeuta e paciente podem se deparar ao longo da vida com desafios e dificuldades muitos similares, uma vez que ambos estão suscetíveis as mesmas armadilhas de linguagem. Em virtude disso, terapeutas ACT são convocados a não restringir o seu entendimento do funcionamento do comportamento humano a um prisma técnico e teórico, mas também se abrirem a entrar em contato com as próprias cognições e emoções. Isso porque “algumas das habilidades que produzem flexibilidade psicológica não podem ser aprendidas por meio de regras literais diretas, porque precisam ser aprendidas pela experiencia” (Hayes, Strosahl & Wilson, 2021, pág. 114).

Esse entendimento de uma psicologia da normalidade, em que terapeuta e paciente estão sujeitos as mesmas leis comportamentais nos lembra que a relação terapêutica (tal como qualquer relação humana), precisa ser construída e continuamente cuidada, de forma que este seja um ambiente seguro e acolhedor. Isso não quer dizer que não aparecerão emoções desconfortáveis (já que toda as narrativas que permeiam as sessões envolvem inúmeras emoções), mas simplesmente que “uma boa relação terapêutica proporciona uma dimensão humanizada às sessões de terapia” (Hayes, Strosahl & Wilson, 2021, pág. 119).


É importante ressaltar que não há a priori comportamentos pré-estabelecidos como sendo desejados, pois, o que pode ser considerado avanço para um paciente pode ser esquiva para outro, e isso se verifica na própria relação terapêutica. Para um paciente, demonstrar descontentamento ou mesmo irritabilidade com uma atitude do terapeuta pode ser um grande ponto de melhora (no caso de um paciente que pouco expressava as suas emoções e seus anseios), porém, para um outro paciente extremamente crítico, que diminui o comportamento de quem está ao seu redor, independente do
contexto, tal apontamento parece ser mais a repetição de um padrão disfuncional do que um ponto de melhora.


Só que ter essa discriminação exige de nós terapeutas a construção de um olhar “de fora”, que não fica restrito e “grudado” na literalidade da narrativa trazida pelo paciente. Até porque, a maior parte das narrativas trazidas serão permeadas de muita dor, e se não estivermos atentos tentaremos “salvar” os nossos pacientes de seus sofrimentos, quando na verdade o que eles precisam de nós é: empatia, acolhimento e colaboração para construírem uma vida mais significativa para si.

Por fim, um terapeuta ACT entende que “as relações terapêuticas são fortes, abertas, acolhedoras, mútuas, respeitosas e carinhosas” (Hayes, Strosahl & Wilson, 2021, pág. 129), e, ainda que não sejam exatamente um objetivo a ser alcançado, são certamente um veículo extremamente potente para mudança, tanto dos pacientes quanto dos terapeutas.

Referências Bibliográficas

  • Luoma, J.B., Hayes, S.C. & Walser, R.D. (2022). Aprendendo ACT – Manual de habilidades da terapia de aceitação e compromisso para terapeutas. Novo Hamburgo: Sinopsys Editora
  • Hayes, S.C., Strosahl, K.D. & Wilson, K.G. (2021). Terapia de aceitação e compromisso – o processo e a prática da mudança consciente. Porto Alegre:
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Escrito por Mariana Poubel

Graduada em Psicologia pela UFRJ (2012) e mestre em Saúde Mental pelo IPUB/UFRJ (2015). Fez curso de formação em Terapia Cognitivo Comportamental para adultos e infanto juvenil, curso de capacitação em análise do comportamento e formação em terapias contextuais.
Atua como terapeuta, supervisora e mentora.

Email para contato: marianapoubel@gmail.com

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