Muitos clientes iniciam o processo psicoterapêutico como o primeiro passo para cuidar da saúde mental. Suas queixas iniciais podem envolver sintomas físicos e/ou observáveis de sofrimento, por exemplo, alterações de apetite, sono, libido; mas não necessariamente.
As queixas do cliente podem também se direcionar mais aos comportamentos privados (não diretamente observáveis por terceiros), por exemplo, alteração da frequência e intensidade de alguns pensamentos, como pensamentos autodepreciativos, de desesperança em um presente ou futuro que viabilizem a realização de projetos.
Caberá ao psicoterapeuta partir das queixas iniciais do cliente para então coletar mais dados sobre os repertórios comportamentais daquela pessoa. A partir da sistematização dos comportamentos do cliente em tríplices contingências de reforçamento, serão construídas as análises funcionais principais acerca dos comportamentos do cliente. Busca-se, com isso, compreender como o repertório comportamental do cliente foi instalado ao longo de sua história de contingências de reforçamento, bem como quais contingências de reforçamento mantêm tais repertórios no presente.
A construção de análises funcionais molares também permitirá ao psicoterapeuta, em conjunto com o cliente, estabelecer objetivos psicoterapêuticos: identificar quais comportamentos precisam ser enfraquecidos, instalados, generalizados, por exemplo.
O psicoterapeuta em Terapia por Contingências de Reforçamento (TCR) tem como ferramenta de análise e de intervenção as contingências de reforçamento. Isto significa que suas intervenções com o cliente visam ao manejo das contingências de reforçamento como os procedimentos psicoterapêuticos, sempre baseados nos princípios das Análises Experimental e Aplicada do Comportamento. As alterações nas contingências de reforçamento é que irão nos responder sobre a efetividade do processo psicoterapêutico, bem como a confirmação ou a necessidade de reformulação das hipóteses explicativas para os comportamentos-alvo do processo psicoterapêutico.
Ainda que o cliente consiga fazer alterações nas contingências de reforçamento, orientado pelo psicoterapeuta, há situações em que o sofrimento do cliente não é reduzido de maneira suficiente para restaurar seu bem-estar.
Também há condições nas quais um psicoterapeuta experiente conseguirá identificar, por meio das investigações iniciais, a ocorrência de comportamentos indesejados (sintomas) que sinalizam a necessidade de encaminhar o cliente para uma avaliação e tratamento feitos por um médico psiquiatra.
Alguns repertórios do psicoterapeuta poderão favorecer esta conduta, de forma que minimize os comportamentos de esquiva do cliente e aumentem a chance de adesão a tal recomendação.
Primeiramente, precisamos nos atentar à qualidade do vínculo psicoterapeuta-cliente. O psicoterapeuta deve sempre cuidar para emitir comportamentos de atenção e escuta genuínos aos relatos feitos pelo cliente, de forma que produza no cliente sentimentos de validação e de ser compreendido.
Além disso, o psicoterapeuta deve basear suas avaliações funcionais nos critérios e parâmetros vigentes no ambiente em que o cliente está inserido. Apesar de termos manuais médicos, para consulta, que nos apresentam critérios para o rastreio de doenças psiquiátricas, o psicoterapeuta deve evitar ficar preso a tais critérios dos manuais de maneira arbitrária. Levando isso para a prática, o psicoterapeuta precisa contemplar em sua análise os prejuízos e riscos aos quais o cliente está exposto ao manter seus padrões de comportamento atuais.
Acredito também que existe um objetivo comum a todos os processos psicoterapêuticos: desenvolver e ampliar o autoconhecimento do cliente.
Juntando este objetivo à necessidade de realizar o encaminhamento para o psiquiatra, o psicoterapeuta poderá ter sucesso em suas intervenções se der bastante importância para a descrição das contingências de reforçamento em operação, nas quais os comportamentos indicativos de sofrimento estiverem ocorrendo. Também pode ser muito útil levar o cliente a uma reflexão em que ele compare sua qualidade de vida atual com alguma fase anterior em que já tenha experimentado maior sucesso em seus comportamentos e menos sinais de sofrimento.
A descrição de comportamentos, bem como a sua relação com os eventos antecedentes e as consequências produzidas pelos comportamentos, evita o caráter avaliativo e de julgamento, que podem ser aversivos para qualquer cliente.
Infelizmente, o psicoterapeuta precisa se lembrar de que tratamento psiquiátrico ainda é parcialmente incompreendido, devido a muitos mitos e desconhecimento que rondam o tema.
Ouvir atentamente e dar importância às regras e autorregras que o cliente possuir a respeito dos tratamentos (tanto psicoterapêutico como psiquiátrico) também se faz necessário e fortalece a relação psicoterapêutica.
O psicoterapeuta também se beneficia de ter uma formação mínima a respeito de psicopatologias, o que lhe requer que esteja atento a publicações científicas recentes, e comunicações feitas pela comunidade médica aos profissionais não-médicos e ao público geral sobre saúde mental. Informação atualizada lhe permitirá realizar encaminhamentos que se fizerem necessários – e isso vai além do encaminhamento para o médico psiquiatra.
Há casos em que será necessário fazer o encaminhamento comunicando também algum familiar – no caso em que o cliente possa colocar sua saúde e segurança em risco, ou a de terceiros.
Em muitos casos no cotidiano da clínica psicoterapêutica, isso não se faz necessário, mas pode ser necessário que o psicoterapeuta acompanhe o desenvolvimento do cliente, observe alguns comportamentos de esquiva e tenha que retomar este procedimento mais adiante no processo psicoterapêutico. Enquanto isso, deverá desenvolver os procedimentos e intervenções psicoterapêuticos que visem ao alcance dos objetivos psicoterapêuticos.
Processo psicoterapêutico e tratamento psiquiátrico podem ser – e são, muitas vezes, aliados com um mesmo objetivo: a promoção de saúde dos clientes (com o desenvolvimento e manutenção de repertórios comportamentais compatíveis com as contingências de reforçamento em operação).
Referências
Guilhardi, H. J. (2007). Algumas diretrizes para melhor ação terapêutica. Disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/pdf/helio/algumas_diretrizes.pdf
Guilhardi, H. J. (2015/2018). Classificação básica dos comportamentos na psicoterapia: funcional-disfuncional; desejável-indesejável; desejado-indesejado. Disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/pdf/helio/classificacao.pdf