Decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferida nessa terça-feira (10/12) afeta o direito ao tratamento de indivíduos que possuem qualquer decisão judicial que garante direito a tratamentos de saúde
A 4ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu nessa terça-feira (10/12), cabe ressaltar que por unanimidade e cujo relator foi o ministro Luis Felipe Salomão, decisão de que o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) constitui cobertura mínima e taxativa, e não exemplificativa. Isso significa que os Planos de Saúde poderão se recusar a custear qualquer tratamento de saúde que não esteja elencado no rol da ANS que envolve, muitas vezes, medicamentos para câncer, doenças raras e demais tratamentos ainda não apreciados pela agência nas revisões periódicas do rol que ocorrem a cada dois anos.
Decisão do STJ contaria e a Lei 12.764/12, e as Súmulas dos Tribunais Estaduais
A decisão da 4ª Turma do STJ contraria expressamente a lei 12.764/12, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, “b” a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com autismo. No mesmo sentido, a decisão contraria o entendimento já solidificado por diversas Súmulas proferidas por Tribunais Estaduais de diferentes Estados do país como, por exemplo, a Súmula 102 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que determina que: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”.
Decisão
do STJ coloca em risco direito ao tratamento de crianças autistas
As crianças autistas que pleiteiam ou já possuem a decisão judicial para o
tratamento gratuito devem sofrer diretamente o impacto das mudanças proferidas.
A preocupação é que, ainda que da 3ª Turma do STJ ainda não tenha decidido
sobre o assunto, os juízes de primeira instância e desembargadores já comecem a
seguir o entendimento proferido pela 4ª turma, o qual não é
vinculante e pode ser modificado. Esse acontecimento afeta diretamente o
direito ao tratamento de crianças ou qualquer indivíduo com diagnóstico de
autismo uma vez que praticamente todas as terapias prescritas pelos médicos
especialistas no assunto apesar de possuírem comprovação científica ainda não
estão elencadas no rol da ANS e, portanto, não serão mais garantidas pela
justiça.
A
Intervenção em ABA e a decisão do STJ
Toda criança com TEA (Transtorno do Espectro Autista) tem direito ao acesso do
tratamento em ABA (Análise do Comportamento Aplicada), comprovado
cientificamente e indicado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) para o
tratamento de crianças com autismo. A Análise do Comportamento Aplicada já é
reconhecida em diversos países como Estados Unidos, Inglaterra e Espanha e
possui amplo embasamento de pesquisas que classificam o tratamento no rol de
“práticas baseadas em evidência científica”.
Retrocesso
aos direitos dos usuários
Sendo assim, mais uma vez a justiça brasileira vai na contramão dos direitos e
garantias conferidos aos consumidores que, nesse caso, envolvem indivíduos em
alta situação de vulnerabilidade.
Pela
Constituição, todo cidadão tem direito à saúde – mobilização da população
O Instituto de Pesquisa Conduzir que promove pesquisas em Análise do
Comportamento Aplicada e que atende crianças, adolescentes e adultos com TEA
(Transtorno do Espectro Autista), com o apoio das famílias, clínicas e
entidades manifesta repúdio a decisão da 4ª Turma do STJ e
pretende conscientizar a população e as demais turmas do mesmo Tribunal quanto
as danosas consequências de tal decisão. A votação da 3ª Turma deverá ocorrer
em meados de janeiro de 2020.
Quem compõe a 4ª Turma do STJ que votou de forma unânime: Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi.
Quem compõe a 3ª Turma do STJ que irá votar: Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino, Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro.
Texto: Renata Michel – Diretora do IPC, Bacharel em Direito e Analista do Comportamento e Doutoranda em Análise do Comportamento PUC-SP.