Há quem diga que psicoterapia não é para todos e que se destina à resolução de problemas humanos. Há também aqueles que acreditam que psicoterapia é para pessoas que sofrem de alguma desordem mental, ou para loucos. Outros acham que psicoterapia não funciona, ou que é futilidade. Muitos também relatam que o psicólogo é alguém que você paga para ouvir seus problemas. Preconceito e falta de conhecimento a respeito deste trabalho é o que não falta, e uma consequência deste panorama é a dificuldade que os psicólogos clínicos têm em formar sua clientela, afinal, se a maior parte das pessoas percebe a psicoterapia por vieses como estes, é pouco provável que estas pessoas busquem ajuda de um psicólogo.
Além do preconceito e falta de informação com este trabalho, há também aqueles que invalidam muitas questões relacionadas a algum tipo de sofrimento, acreditando serem “frescuras”, impossibilitando que estas questões sejam trabalhadas e resolvidas, o que resultaria na melhoria da saúde e qualidade de vida. Por exemplo, uma pessoa com medo de morrer sem estar doente, pode ter seu sofrimento invalidado; mas, esse medo pode ser um sinalizador de problemas graves como depressão ou síndrome do pânico, que poderiam ser trabalhados e resolvidos em psicoterapia. De fato, pode parecer incongruente para as pessoas o medo de morrer sem ao menos estar doente, parece que não há motivo para tal medo, e quando não se acha uma explicação para um problema, além de classificar como “frescura”, as pessoas tendem a atribui-lo a uma desordem interna, como se o sofrimento fosse inerente à pessoa. Mas, os seres humanos nascem apenas com alguns reflexos, a maior parte das características de uma pessoa são aprendidas e desenvolvidas ao longo de suas vidas, e tudo aquilo que foi aprendido pode ser mudado em algum nível. Neste sentido, todos podem se beneficiar de um processo psicoterápico, uma vez que nele é possível aprender a lidar com os eventos da vida de forma mais satisfatória, contribuindo para a redução do sofrimento e promoção de saúde e bem-estar (Conte & Brandão, 2002).
Mas, então, como um psicoterapeuta pode ajudar neste aprendizado? O psicoterapeuta busca analisar o problema apresentado pelo cliente, identificando os fatores que o determinam; baseando-se nesta análise, o terapeuta pode auxiliar no aprendizado de ações possivelmente mais efetivas, que possam culminar na resolução do problema, no alívio do sofrimento e na produção de bem-estar (Conte & Brandão, 2002).
Uma análise bem realizada das queixas do cliente é fundamental para o sucesso da psicoterapia. Por isso, para aqueles que dizem que psicoterapia não funciona, saibam que funciona sim, mas alguns aspectos podem interferir levando à ineficácia do tratamento (Otero, 2006):
- Um primeiro aspecto a considerar refere-se ao próprio cliente: 1) clientes que buscam psicoterapia por motivação própria, estão mais propensos a se envolverem no processo e a agirem de modo diferente, o que pode resultar na solução do caso; 2) as expectativas do cliente quanto ao processo psicoterápico devem ser identificadas e discutidas, para conduzi-lo à realidade de como o processo poderá funcionar; 3) a adesão do cliente é fundamental, pois uma pessoa envolvida nos elementos necessários para a mudança tem maior probabilidade de conseguir resolver seus problemas.
- Outro aspecto refere-se à natureza do problema apresentado pelo cliente, pois quando há fatores orgânicos envolvidos no problema, outros profissionais – além do psicólogo – podem ser necessários.
- O profissional/psicólogo também pode influenciar na eficácia do tratamento, considerando a disponibilidade do terapeuta para acolher o cliente, o equilíbrio entre o saber teórico e a humildade frente ao cliente, a capacidade em explorar além da queixa tal como é apresentada.
- Por último, têm-se os elementos referentes à relação terapeuta-cliente, que deve ser permeada por empatia, disponibilidade para ajudar e receber ajuda, fatores que contribuem para o vínculo terapêutico.
Mas, a eficácia de um processo de psicoterapia não pode ser medida apenas pelo fato de um problema ter sido resolvido, pois mesmo que uma pessoa não considere que esteja passando por um problema, ela também pode se beneficiar de um processo de psicoterapia, no sentido de desenvolver autoconhecimento. Afinal, “uma pessoa que se tornou consciente de si mesmo, por meio de perguntas que lhe foram feitas, está em melhores condições de prever e controlar seu próprio comportamento” (Skinner, 1974/2006, p. 31). Isto quer dizer que qualquer pessoa pode se beneficiar da psicoterapia para compreender o que influencia sua forma de agir no mundo e o que decorre de suas ações, facilitando a ela encontrar formas mais efetivas de lidar com as situações da própria vida.
Agora que você, leitor, sabe que as pessoas podem se beneficiar da psicoterapia tanto para a solução de problemas, como a prevenção deles na medida em que uma pessoa desenvolve seu autoconhecimento, é preciso que você saiba que existem formatos de psicoterapia diferentes, cada um orientado por uma determinada proposta teórica. Não pretendo desenvolver aqui uma explicação para todas as possibilidades de psicoterapia, me limito a apresentar-lhe a Terapia analítico-comportamental, baseada nos princípios filosóficos do Behaviorismo Radical e em estudos científicos provenientes da Análise Experimental do Comportamento. Nesta abordagem, considera-se que o comportamento humano – entendido como ações, pensamentos e sentimentos – está em constante interação com o ambiente e é modificado pelas experiências decorrentes desta interação. Assim, um terapeuta analítico-comportamental, busca entender as questões apresentados pelo cliente por meio da análise funcional dos seus comportamentos, identificando as experiências passadas e presentes que contribuem para que eles existam, quais são seus efeitos, e o que precisa ser modificado para que o indivíduo possa ter uma relação mais eficiente com o ambiente, contribuindo para a melhoria em sua saúde e qualidade de vida (Meyer, Del Prette, Zamignani, Banaco, Neto & Tourinho, 2014).
Ainda há muito que fazer em termos de práticas voltadas à divulgação da psicoterapia como um meio para atingir saúde e qualidade de vida. Este texto apresentou apenas algumas considerações neste sentido, a fim de mostrar às pessoas que um processo de psicoterapia abrange muito mais possibilidades do que se imagina.
REFERÊNCIAS
Conte, F. C. S.; & Brandão, M. Z. S. (2002). Problema psicológico ou frescura? Quando a ajuda profissional se faz necessária. In M. Z. S. Brandão; F. C. S. Conte; & S. M. G. Mezzaroba. (Eds.), Comportamento humano: tudo (ou quase tudo) que você gostaria de saber para viver melhor. (pp. 3-12). Santo André, SP: ESETec Editores Associados.
Meyer, S. B.; Del Prette, G.; Zamignani, D. R.; Banaco, R. A.; Neno, S.; & Tourinho, E. Z. (2014). Análise do Comportamento e Terapia Analítico-comportamental. In E. Z. Tourinho; & S. V. De Luna. (Eds.), Análise do Comportamento: Investigações históricas, conceituais e aplicadas. (pp. 153-174). São Paulo: Editora Roca.
Otero, V. R. L. (2006). Psicoterapia funciona? In R. C. Wielenska (Ed.), Sobre Comportamento e Cognição: Psicologia Comportamental e Cognitiva – Questionando e ampliando a teoria e as intervenções clínicas e em outros contextos. (pp. 146-149). Santo André, SP: ESETec Editores Associados.
Skinner, B. F. (1974/2006). O mundo dentro da pele. In B. F. Skinner. (Ed.), Sobre o behaviorismo. (pp. 23-32). São Paulo: Editora Cultrix.