Nas semanas após a eliminação da Seleção Brasileira da copa do mundo, a Psicologia Esportiva esteve constantemente presente, muitas matérias em jornais eletrônicos e muitas opiniões – às vezes divergentes sobre a atuação da Psicologia na Seleção Brasileira. Avaliar o trabalho realizado é uma tarefa difícil, o contexto não se restringia só ao espaço que era oferecido para o trabalho da Psicologia do Esporte, dependiam, também, de outras instancias e relações dentro da instituição.
A história da Psicologia do Esporte é longa, e muito relacionada com os acontecimentos da 1ª e 2 ª guerra mundial, por exemplo. Por ser um assunto extenso, os detalhes de sua construção serão abordados em próximos textos, procurando relacioná-los com seu desenvolvimento enquanto área de especialidade da Psicologia. A Psicologia do Esporte, atualmente, pode ser dividida em: Esporte de Alto Rendimento, Esporte Educacional, Esporte Recreativo ou Tempo Livre e Esporte de Reabilitação. Nessas áreas os profissionais trabalham com Ensino, Pesquisa e Intervenção, porém, quase sempre se transita por essas três áreas.
Breve história da Psicologia do Esporte
Os primeiros estudos em Psicologia do Esporte foram desenvolvidos em dois âmbitos. De um lado a pesquisa sobre os processos fisiológicos, tempo de reação, e outros aspectos do desenvolvimento motor, decorrentes da prática física e, por outro lado, os processos comportamentais, emocionais e motivacionais decorrentes do exercício físico. (Davis, Huss e Becker, 1995).
A área das Ciências do Esporte ilustra que a Psicologia do Esporte surge com o objetivo de compreender fatores psicológicos e utilizar ferramentas da Psicologia para o aumento de rendimento dos atletas. Os principais pontos de conflito vêm exatamente do início, firmação e produção de conhecimento em ambas as áreas. Pelo que indica a literatura, a área da Educação Física leva em consideração – a princípio – os processos de bioquímica, biomecânica, estudos do movimento e etc., já a área da Psicologia do Esporte como especialidade da Psicologia surge como o estudo do comportamento do indivíduo no contexto da atividade e prática esportiva, levando em consideração os fatores não só da prática em si, mas também, os fatores e variáveis sociais desse contexto (Weinberg e Gould, 1995; Vieira et al, 2010; Rubio, 1999).
A Análise do Comportamento e o Esporte
Na área um, dos expoentes é Garry Martin (2001), autor do livro “CONSULTORIA EM PSICOLOGIA DO ESPORTE: Orientações práticas em Análise do Comportamento”, Traduzido pelo IAC – Instituto de Análise do Comportamento em 2001. O Livro oferece um material amplo e bem descrito a respeito dos procedimentos comportamentais aplicados ao contexto esportivo, sendo uma publicação de referência na área.
No Esporte a aplicação comportamental tem sua base nos conceitos criados a partir dos processos experimentais de laboratório, como, por exemplo, o Comportamento Verbal. Um estudo realizado por Scala e Kerbauy (2005) utilizou o procedimento encoberto de Auto fala – onde o sujeito que emite o comportamento verbal é o ouvinte. O objetivo do estudo foi verificar se, ao descrever para si a ação a ser executada e os estímulos para o quais deveriam voltar sua atenção, os atletas melhorariam suas marcas do salto em barreiras no atletismo. Os estímulos relevantes para a situação experimental foram: 1- A auto fala pertinente ao momento da largada – VAI. 2- Auto fala como estímulo discriminativo para o momento de pular a barreira da pista – PASSA. 3 – A descrição para si da ação a ser executada após a última barreira e atentar para o fim do percurso – VAI. Os resultados mostraram-se satisfatórios para quatro dos cinco participantes do estudo. A comparação entre linha de base e fase de intervenção mostra melhoras no tempo dos atletas. Geralmente nessa modalidade de experimento não há fase de reversão ou retirada da variável experimental inserida anteriormente, pois não há como medir se de fato o sujeito passou a não utilizar mais a variável inserida – neste caso o comportamento encoberto. As medidas de eficácia, além da comparação entre linha de base e fase experimental, conta também com o relato dos participantes, constituindo dados importantes para a avaliação dos resultados.
As pesquisas sobre condicionamento operante verbal – e a publicação do Verbal Behavior – permitiram o acesso aos comportamentos humanos complexos, possibilitando ao analista do comportamento o estudo das variáveis que exercem controle sob o comportamento, dentre estes estudos de comportamentos complexos e estudos das variáveis, está a Psicologia do Esporte. Ainda, segundo O salto nos procedimentos comportamentais aplicados ao esporte se deu a partir dos estudos sobre comportamento verbal, onde a manipulação de variáveis passou a ser estendida para outros contextos – extra laboratório – levando em conta a relevância social e a importância dos estudos para a resolução de problemas do dia a dia (Kazdin 1978; De Cillo 2000, 2002) Na Publicação de 1957 – Verbal Behavior – Skinner (1957) inicia o livro explicando que, o comportamento verbal, assim como quaisquer outros comportamentos, também são comportamentos operantes, são modelados e mantidos por suas consequências. As consequências deste comportamento, disponibilizadas por um ouvinte da mesma comunidade verbal, também são passíveis de Análise Funcional, permitindo aos estudiosos dividir as relações em pequenas partes e analisá-las em separado, como por exemplo, a análise funcional do comportamento verbal de um técnico durante o processo de treinamento de um atleta e, consequentemente, como esse comportamento afeta o responder do atleta.
Para aqueles que se interessam pelo assunto no link https://comportese.com/2012/10/afinal-o-que-e-esse-tal-comportamento.html há uma ótima explicação referente ao comportamento verbal.
Ao relacionar Psicologia do Esporte e Análise do Comportamento não há, no entanto, um modo específico de intervir em cada situação. Como Analistas do Comportamento sempre levamos em consideração o histórico de reforçamento do sujeito, o que mantém o comportamento e como os elementos presentes no ambiente exercem influência sob determinada resposta. Não partimos de uma média populacional para o entendimento das relações e porque o sujeito se comporta de determinada maneira. Para Scala (2000) um bom modo de desenvolver um programa de intervenção é ter como base procedimentos que já demonstraram resultados em situações semelhantes. Nesse sentido um bom repertório de pesquisa e analise funcional se faz necessário, as variáveis a se analisar são amplas e envolvem não só o treino do atleta em si, as condições institucionais surgem como um fator a ser levado em consideração. Além do mais, formas de mensuração e demonstração (gráficos, tabelas e etc.) das relações e o modo como o sujeito se comporta, servem não só para termos dados sobre a intervenção pretendida, é um modo de aproximar equipes, explicitar quais resultados se pretendem alcançar.
Nesse momento, algumas coisas são necessárias para o profissional. (1) Um bom repertório acerca dos conceitos básicos da análise do comportamento, (2) um bom repertório de pesquisador – como não há uma receita geral para planejar intervenções, é necessário saber identificar variáveis dependentes e independentes do contexto que se pretende trabalhar. Mas porque isso é importante? Sabendo identificar, descrever e controlar as variáveis, além de desenvolver um método consistente, o profissional consegue explicar o que faz, por que faz e como o faz de modo claro, é capaz explicar seus procedimentos para o técnico, atleta e outros profissionais das equipes, tornando seu trabalho algo palpável e compreensível para outros profissionais.
Não só no contexto esportivo, mas em diversos campos, o trabalho da Psicologia é feito em equipe, buscando – se a interdisciplinaridade, algo ainda difícil de se alcançar, ainda mais se pensarmos que o tropeço inicial vem dos nossos próprios limites e preocupação em tornar a linguagem, e formas de explicação, acessíveis as outras áreas.
Uma aproximação e estudo prévio da modalidade em que se pretende trabalhar também são interessantes, não são fatores determinantes, mas podem ser ótimo norteador ao se planejar uma intervenção. As vivências anteriores de treinos e ajuda na preparação de atletas para a competição, proporciona ao Analista do Comportamento, no contexto esportivo, manipular variáveis de modo mais direto. No treino de manoplas (https://www.youtube.com/watch?v=K2bEeeveqxY) ou no saco de pancadas (https://www.youtube.com/watch?v=hBQg_f5q4Kk) como o profissional pode intervir no comportamento verbal do técnico para que o atleta consiga chegar a resposta desejável de modo satisfatório e duradouro? Ou, como o controle de estímulos – seja com procedimentos de Auto Fala ou Visualização – podem fazer com que o atleta volte sua atenção para a realização de determinada técnica no treino? Será que reforçando os estímulos relevantes para aquela situação, inserindo regras e metas de desempenho (construídas em conjunto com técnico e atleta), é possível fazer com que os estímulos externos percam sua força e deixem de exercer influencia sob o comportamento do atleta, pelo menos naquela situação?
Por outro lado há procedimentos que visam simular ao máximo a situação de treino, para que se torne similar a competição – Podem se iniciar com o comportamento verbal do técnico e sua influencia sob o comportamento do atleta, tanto nos treinos, na concentração minutos antes da competição ou na competição em sí, ou no procedimento de pareamento da música que os atletas utilizam ao percorrerem o caminho do vestiário até o ring ao Ring ou Octagon aos exercícios de ativação fisiológica realizadas no treino. Até mesmo o pareamento da música com estados de atenção como, por exemplo, a utilização da musica durante os treinos, aliada aos procedimentos de treino discriminativo para as situações relevantes – seja no treino tático e técnico tentando-se manter o atleta não tão suscetível aos estímulos presentes na competição – torcida adversárias, aquele adversário que horas antes fez declarações provocativas.
Por fim, a Psicologia do Esporte vem ganhando espaço se tornando conhecida e procurada. É comum perguntas e questionamentos sobre o que fazer ou quais técnicas utilizar. A atividade ou exercício físico também são comportamentos, logo, pode se dizer que, estando o comportamento humano em todos e qualquer espaço que nos encontremos. Assim, as leis comportamentais descritas e formuladas por Skinner (1957) – estimulo discriminativo, comportamento operante, comportamento mantido por regra – e Sidman (1989) – as implicações da coerção – por exemplo, se encontram nesses ambientes.
Referências Bibliográficas
DAVIS, Stephen F.; HUSS, Matthew T.; BECKER, Angela H. Norman Triplett and the dawning of sport psychology. The Sport Psychologist, 1995.
DE CILLO, Eduardo Neves P. Psicologia do esporte: conceitos aplicados à partir da Análise do Comportamento. 2002.
MARTIN, Garry L. Consultoria em Psicologia do Esporte. Orientações práticas em análise do comportamento. Campinas, SP: Instituto de Análise do Comportamento, 2001.
KAZDIN, Alan E. History of behavior modification: Experimental foundations of contemporary research. University Park Press, 1978.
RUBIO, Katia. A psicologia do esporte: histórico e áreas de atuação e pesquisa. Psicologia: ciência e profissão, v. 19, n. 3, p. 60-69, 1999.
SCALA, Cristiana Tieppo. Proposta de intervenção em psicologia do esporte.Revista Brasileira de terapia comportamental e cognitiva, v. 2, n. 1, p. 53-59, 2000.
SCALA, Cristiana Tieppo; KERBAUY, Rachel Rodrigues. Autofala e esporte: estímulo discriminativo do ambiente natural na melhora de rendimento.Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, v. 7, n. 2, p. 145-158, 2005.
SIDMAN, M. Coerção e suas implicações (Tradução de Maria Amália Andery & Teresa Maria Sério). Campinas: Editora Livro Pleno.(Obra original publicada em 1989), 1995.
SKINNER, B. F. (1978). O comportamento verbal. (M. da P. Villalobos, Trad.). São Paulo: Cultriz. (Obra original publicada em 1957).
VIEIRA, Lenamar Fiorese et al. Psicologia do esporte: uma área emergente da psicologia. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 15, n. 2, p. 391-399, 2010.
WEINBERG, Robert S.; GOULD, Daniel. Foundations of sport and exercise psychology. Human Kinetics, 1995.