Discussões Teóricas e Conceituais sobre Reforçadores Naturais, Sociais e Arbitrários

A distinção entre reforçadores naturais e arbitrários é problemática em Análise do Comportamento e não há conformidade nos uso desses conceitos dentre os analistas do comportamento. Goldiamond, Ferster, Kohlenberg, Tsai entre outros defendem o uso de reforçadores naturais em detrimento dos arbitrários no contexto aplicado pelos seus prováveis efeitos colaterais indesejáveis. A despeito da relevância dessa discussão, não há parâmetros específicos que permitam, com segurança, especificar se determinados reforçadores são naturais ou arbitrários. De modo que é possível identificar na literatura casos em que reforçadores claramente arbitrários são considerados naturais pelos autores.
As definições de que os reforçadores naturais são aqueles que normalmente mantêm uma resposta é altamente insatisfatória, na medida em que resta definir funcionalmente o “normalmente”. Sem uma operacionalização do “normalmente”, tal definição é inútil. Utilizar o normal do ponto de vista estatístico seria excluir a função da definição. 
Uma alternativa um pouco mais extremista para diferenciar um tipo de reforçamento do outro é considerar todo reforçador social como arbitrário. Os reforçadores naturais, portanto, se restringiriam aqueles advindos das relações mecânicas e químicas com o ambiente não social. No exemplo clássico, uma criança vestiria um caso para evitar a saída de calor do seu corpo (frio), o que seria aversivo. Nesse caso, a saída de calor seria o reforçador negativo natural de vestir o casaco, ao passo que o elogio advindo de uma pessoa (e.g., “que linda, conseguiu vestir o casaco sozinha”) seria considerado um reforçador arbitrário. Mesmo com essa definição trazendo certa tranquilidade conceitual, ela deixa de fazer distinções que talvez fossem úteis na discussão dos efeitos colaterais do uso de reforçadores arbitrários no contexto aplicado como aquela trazida por Ferster, Goldiamond entre outros. Desse modo, eu propus outro critério e uma nova taxonomia. 
Eu proponho trabalharmos com os conceitos propostos por Skinner de agente controlador e agente controlado. Ao invés de começarmos definindo os reforçadores naturais, vamos começar pelos arbitrários. Logo, o reforço arbitrário é utilizado artificialmente por um agente controlador (experimentadores, pais, professores, terapeutas, padres, pastores, maridos, esposas etc.) tendo como reforço a mudança ou manutenção da frequência de comportamentos de agentes controlados (sujeitos, filhos, alunos, clientes, fiéis, esposas, maridos etc.). Inclusive, cabe discutir se o fazem obrigatoriamente com autoconhecimento. Reforçadores automáticos (comportamentos de alta probabilidade de acordo com o princípio de Premack) ou primários poderiam ser utilizados artificialmente por agentes controladores, se constituindo em reforçamento arbitrário. O sexo poderia funcionar como reforçador arbitrário para o marido tratar bem a sua esposa, por exemplo, caso ela o manipulasse artificialmente com a função de aumentar a frequência de comportamentos gentis do marido. 
Ao mesmo tempo, alguns reforçadores condicionados e sociais, poderiam ser considerados naturais de acordo com tal definição. Obviamente, de acordo com essa proposta, todo reforçador arbitrário é social, mas não necessariamente todo reforçador social seria arbitrário. Um balconista de uma lanchonete que entrega um salgado a um cliente que o solicita (i.e., emite um mando) estará provendo um reforçador natural, já que não o faz com a função de controlar o comportamento do cliente na condição agente controlado. Ele não entrega o salgado com a função de o cliente lhe pedir mais vezes ou aprender a pedir. Ele o faz, provavelmente, sob o controle de consequências aversivas arbitrárias impostas pelo seu patrão caso não faça o seu serviço. Nesse sentido, o balconista não age como um agente controlador. Fica difícil imaginar um reforçamento mais natural para o mando “me dê um salgado, por favor!” que a entrega de um salgado. Não há dúvidas de que a entrega do salgado é um reforçador social, já que é provido por outra pessoa, ao mesmo tempo, se configura em um reforçador natural de acordo com a definição acima. 
O exemplo acima é completamente diferente de quando um terapeuta diz ao seu cliente que está orgulhoso por ele ter relatado ter conseguido convidar um amigo para sair (presumindo-se que esse fosse um comportamento desejável), por exemplo. Também é diferente de quando um terapeuta diz para o seu cliente que está feliz porque finalmente o cliente passou aceitar as suas demonstrações de afeto. Em ambos os casos, fica clara a adição de reforçadores artificialmente às contingências tendo como função o controle dos comportamentos do cliente. Além de ter a companhia do amigo para sair, ou de entrar em contato com os respondentes reforçadores eliciados pelas demonstrações de afeto do terapeuta, seus comportamentos foram reforçados com elogios. Com base nisso, eu proponho a definição de reforçadores sociais naturais e arbitrários. 
No caso do mando, fica mais fácil visualizar a distinção, já que o reforçador especificado na topografia da resposta verbal seria o reforçador natural, mesmo que seja um elogio, por exemplo. Com essa definição, claramente funcionalista, um elogio pode ser considerado um reforçador natural para um mando por elogios. Por outro lado, um elogio pelo fato de ter mandando diretamente um copo d’água ao invés de meramente apontar para a água se configuraria num exemplo de reforçador arbitrário de acordo com a definição proposta.
Já no tato e nos demais operantes verbais, a distinção é mais difícil porque os reforçadores são generalizados e não específicos. Por exemplo, qual é o reforçador natural que controla o contar uma história. Não seria um comentário do tipo: “nossa que história legal. Parabéns!” emitido por ouvinte tendo como função fazer com que o falante conte mais histórias. Os reforçadores generalizados são impostos pela cultura como um todo para aumentar a probabilidade dos falantes emitirem tatos. Da mesma forma, um recepcionista de hotel que informa ao futuro hóspede que tem feito frio (i.e., emite um tato sob o controle discriminativo do clima) tem seu tato reforçado por um “Obrigado!”. Logo, existiria um agente controlador num sentido mais amplo. 
Se, ao invés do comentário “nossa que história legal. Parabéns!”, a consequência fosse o ouvinte prestar atenção à história com acenos de cabeça e com perguntas sobre mais detalhes? O aceno com a cabeça talvez se configurasse na mesma categoria do elogio, ou seja, seria uma forma da comunidade verbal manter a emissão de tatos que são úteis para a cultura como um todo. Daí, estamos diante de um problema: Ou definimos todos os reforçadores generalizados como arbitrários, ou teremos que encontrar uma nova taxonomia especificamente para os operantes verbais mantidos por reforçamento generalizado. Taxonomia esta que pudesse separar os reforçadores generalizados naturais de arbitrários. 
Sem dúvida, o pai dizer “correto” quando seu filho diz “bola” na presença de uma exemplifica claramente o uso de reforçamento arbitrário de um agente controlador (o pai) para estabelecer o tato do agente controlado. É reforçador para o pai que seu filho aprenda a tatear, e ele provê um reforçador arbitrário que tem como consequência o aumento na probabilidade de emissão de tatos precisos no futuro. Por outro lado, um terapeuta ouvir com atenção um relato de seu cliente e perguntar mais detalhes tem função reforçadora. Sem dúvida, esse reforçamento parece ser menos arbitrário que o “correto” do pai, só que não faz sentido em se falar de uma gradação entre reforçamento natural e arbitrário. São conceitos do tipo é ou não é. Talvez o “fazer mais perguntas sobre” possa se constituir no reforçamento natural, já que o que controla a apresentação dessa consequência é a obtenção de mais contato com a condição de estimulação não verbal que controla o tato do falante e não o fortalecimento da emissão de tatos. Em outras palavras, o ouvinte, ao fazer mais perguntas sobre o que o falante está falando, tem seu comportamento reforçado por mais detalhes, e não necessariamente pelo aumento da frequência de um dado operante verbal. Mesmo que o aumento da frequência de um dado operante verbal não seja a consequência que controle o comportamento do ouvinte ao fazer mais perguntas sobre, ela acaba tendo essa função, ao servir de Sd para novas respostas verbais sobre determinado tema, sinalizando que estas serão provavelmente reforçadas. 
Já o “hum, hum” assim como o aceno de cabeça entrariam como reforçadores arbitrários tomando-se a própria comunidade verbal como um agente controlador no sentido mais amplo conforme discutido acima, já que teriam sim a função de manter o falante se comportando verbalmente. 
Voltando ao exemplo do terapeuta, caso ele faça mais perguntas sobre determinado tema para que o cliente passe a falar mais sobre esse tema estará, sem dúvida, atuando como um agente controlador, logo, reforçando arbitrariamente. Mesmo no caso dos mandos, quando o terapeuta faz um esforço para mudar o horário mediante o pedido de seu cliente para treinar mandos puros também atuará como agente controlador e estará reforçamento arbitrariamente. Desse modo, sempre que o terapeuta provê consequências ao comportamento de seu cliente tendo como reforçador a modelagem/fortalecimento de comportamentos alvo estará provendo consequências arbitrárias. Diante desse quadro, então, não faria sentido mesmo em se falar da distinção entre reforçadores naturais e arbitrários no contexto clínico. 
Uma saída para esse debate poderia ser a forma como o terapeuta dá consequências ao comportamento de seu cliente em relação aos efeitos colaterais do uso de reforçamento arbitrário. Infelizmente não existem estudos empíricos a esse respeito. Entretanto, em termos teóricos, quanto mais o terapeuta tentar prover os reforçadores sociais de forma similar aos reforçadores naturais, menos efeitos colaterais do uso de reforçadores arbitrários serão observados. Em termos práticos, portanto, seria preferível o terapeuta meramente trocar o horário da sessão com base em um mando direto do cliente do que dizer que ele pediu de forma apropriada. Ou, por exemplo, seria preferível o terapeuta pedir detalhes de relatos da emissão de comportamentos desejáveis fora da sessão do que dizer que o cliente está progredindo. Uma alternativa útil seria perguntar especificamente sobre as consequências reforçadoras de emitir um comportamento desejável fora da sessão de terapia ao invés de falar sobre elas para o cliente.
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Escrito por Carlos Augusto de Medeiros

Graduação em Psicologia pela Universidade de Brasília (1997), mestrado em Psicologia pela Universidade de Brasília (1999) e doutorado em Psicologia pela Universidade de Brasília (2003). Atualmente é professor titular do Centro Universitário de Brasília e Professor e Orientador do Instituto Brasiliense de Análise do Comportamento. Coordenador do Curso de Mestrado em Psicologia do UniCEUB. Tem experiência na área de Psicologia Clínica como terapeuta individual e de casais e como supervisor em nível de graduação e pós-graduação. Apresenta publicações na área de relações de equivalência, comportamento verbal, comportamento governado por regras, relações amorosas, questões conceituais, clínica comportamental, análise comportamental de filmes e princípios de análise do comportamento. Junto com Márcio Borges Moreira, é autor do Livro, Princípios Básicos de Análise do Comportamento.

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