Ele mostra o aumento do diagnóstico do TDAH em crianças nos EUA nos últimos 20 anos. De 2003 para cá o número parece ter diminuído, espero que seja por consciência dos profissionais de saúde mental e não consequência de, por exemplo, um aumento indiscriminado de outro diagnóstico, como o autismo.
2. História de vida e cultura
Embora nosso aparato genético possa ter influência no desenvolvimento de determinados transtornos comportamentais, mesmo em caso de pessoas com o mesmo código genético (gêmeos) não temos certeza se ambos irão desenvolver uma psicopatologia. Isso porque o transtorno dependerá também da seleção ontogenética (nossa história de vida) e da cultura em que estamos inseridos.
De tempos em tempos vemos também algum jornal falar sobre ansiedade, depressão ou assassinos em série e podemos pensar “ei, eu tenho isso!” ou então “o meu chefe é um psicopata”. De fato, alguns comportamentos descritos no DSM-IV (2002) são comuns em nossa sociedade, como “comer compulsivamente” ou “perda de energia quase todos os dias”. No entanto, não necessariamente querem dizer que a pessoa está com um transtorno. Em alguns casos é a própria cultura que irá produzir os comportamentos inadequados na pessoa, como na anorexia.
Anorexia é aquele transtorno em que a pessoa faz o possível para emagrecer, mesmo quando já está com o peso corporal perigosamente abaixo do ideal. Curiosamente, este transtorno costuma ocorrer mais nas mulheres do que nos homens, em uma proporção de 10 para 1 (Holmes, 2001). Provavelmente isto acontece devido à importância que nossa cultura dá à beleza, principalmente à cobrança que é feita às mulheres.
Às vezes um mesmo fenômeno pode ser interpretado de maneiras diferentes pela influência cultural, como é o caso da
paralisia do sono. Neste transtorno, a pessoa desperta do seu sono mas não consegue se mover, é como se ela estivesse entre o sonho e a realidade, podendo então ter alucinações bastante vívidas. Segundo Sagan (1995) na Idade Média era muito comum nesse momento as pessoas virem bruxas e outras criaturas malignas. Hoje, está na moda ver extraterrestres e sofrer abduções.
Em outros momentos um fenômeno pode nem estar ocorrendo fora da quantidade normal, mas a mídia fala sobre ele e de repente todos têm algo a dizer, como aconteceu na clínica-escola da faculdade em que leciono atualmente: foi ao ar em um jornal um depoimento de uma apresentadora de televisão dizendo que havia sofrido abuso sexual na infância – nas semanas seguintes o número de ligações de pessoas com queixas semelhantes aumentou consideravelmente. Não posso dizer que o abuso entrou na moda, mas falar sobre ele, pelo menos durante estas semanas, estava.
É importante que os profissionais da saúde mental saibam utilizar os momentos em que um transtorno esteja “na moda” para conseguir a atenção da população e esclarecer as características do transtorno e, principalmente, a forma de tratamento. Isto é especialmente importante para os psicólogos e analistas do comportamento, pois enquanto vemos um crescimento de pessoas buscando diagnósticos médicos e receitas de medicamentos milagrosos, não sei se podemos dizer o mesmo quanto à busca pela análise do comportamento.
obs: eu queria também falar sobre a proposta de “adicção à internet” ao DSM-V, às pessoas que sofrem com “fobia de perder o celular” e um recente caso de uma paciente de transtorno bipolar que escrevia 1333.33% mais mensagens de texto nas fases maníacas, mas achei melhor deixar para outro texto, como por exemplo, “os transtornos da modernidade”.
Referências
Azevedo, L. A.; Almeida, T. C.; Moreira, A. H. (2009). “O resfriado da psiquiatria”: a depressão sob o ponto de vista Analítico-Comportamental. Transformações em Psicologia, 2(2), 65-85.
Holmes, D. S. (2001). Psicologia dos transtornos mentais. Trad. por S. Costa. 2ª Ed. Porto Alegre: Artes Médicas.
Keller, M. B. (1994). Depression: A long-term illness. British Journal of Psychiatry, 165, 9–15.
Rose, S. P. R. (2006). O Cérebro do Século XXI. Trad. H. Londres. 1ª Ed. São Paulo: Editora Globo.
Sagan, C. (1997). O mundo assombrado pelos demônios: a ciência vista como uma vela no escuro. Trad. por R. Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras.
Sclar, D. A.; Robison, L. M.; Bowen, K .A.; Schmidt, J. M., Castillo, L. V.; Oganov, A. M. (2012). Attention-Deficit/Hyperactivity Disorder Among Children and Adolescents in the United States: Trend in Diagnosis and Use of Pharmacotherapy by Gender. Clinical pediatrics, 51(6), 584-589.
Skinner, B. F. (1953). Science and Human Behavior. New York: MacMillan.