No início de cada semestre costuma ser oferecida uma profusão de cursos nas mais variadas áreas para pessoas de todas as idades. Embora há algum tempo psicólogos e educadores enfatizem a importância de evitar preencher demais os horários, é preciso considerar que se por um lado vivemos num mundo repleto de possibilidades e concorrência, por outro as ofertas são tantas e há tanto a aprender que parece mesmo atraente lotar os espaços “livres” na agenda – tanto de adultos quanto de crianças e adolescentes. Especialistas insistem, porém, que do ponto de vista cognitivo, o excesso de horas seguidas de dedicação ao estudo traz poucos benefícios. Eleger prioridades e se dedicar a elas, sem exageros, ao longo do semestre parece ser a melhor solução. Uma pesquisa publicada no periódico americano Nature Neuroscience indica as bases biológicas dessa ideia e enfatiza a importância de buscar estratégias para tirar o melhor proveito possível da própria memória.
O estudo, liderado pelo neurobiólogo John H. Byrne, professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Texas em Houston, recorreu a um método de aprendizagem desenvolvido na Universidade Colúmbia pelo neurocientista austríaco Eric R. Kandel, radicado nos Estados Unidos, ganhador do Prêmio Nobel de Fisiologia/Medicina em 2000 por suas descobertas a respeito da transmissão de informações entre células cerebrais. A técnica consistia em estimular com eletrochoques a cauda da lesma-do-mar Aplysia californica em intervalos regulares e depois observar se o molusco reagia de forma exacerbada ao receber uma descarga menor, pois se lembraria da experiência prévia, indicando aprendizado.
Byrne e sua equipe buscaram determinar se as reações químicas na base dessa resposta poderiam ser adaptadas para reforçar o processo de aprendizagem. Em vez de usar uma lesma inteira, colocaram apenas alguns neurônios sensoriais e motores do animal em uma lâmina. Na sequência, aplicaram cinco pulsos do neurotransmissor serotonina (o equivalente a choques), cada um com 20 minutos de intervalo. A serotonina fez com que as enzimas dos neurônios iniciassem uma cascata bioquímica que, em última análise, reforça a queima de células do cérebro, sinais que equivalem à percepção e à recordação, como se a lesma-do-mar se desse conta da experiência anterior: “Eu me lembro, isso me incomoda”.
Verificou-se que o melhor protocolo de aprendizagem não era o usual, com espaçamentos uniformes, mas uma série de três pulsos de serotonina emitidos com 10 minutos de intervalo; em seguida outro, 5 minutos após, com uma descarga final após 30 minutos. Com esse esquema, a interação entre as duas enzimas aumentou em 50%, indicando que o processo de aprendizagem opera de forma mais eficiente.
Na prática isso quer dizer que deveríamos estudar todos os dias durante duas semanas e depois tirar um mês de folga antes de voltar ao conteúdo? Ainda é cedo para fazer afirmações como essa. O trabalho de Byrne demonstra que a melhor maneira de aprender pode não ser em espaços contínuos de tempo, pois pausas no estudo ajudam a reter melhor as informações. Segundo essa lógica, acumular tarefas e deixar para estudar toda a matéria apenas um dia (ou horas) antes da prova, acreditando que é possível aprender todo o conteúdo de uma só vez, portanto, é pouco producente. Quando nos concentramos por muito tempo em uma atividade, sem parar para descansar, há aumento dos níveis da enzima tirosina fosfatase SHP-2, que interfere no armazenamento de informações na memória.
Agenda cheia demais prejudica desempenho
Fonte: Mente e Cérebro