Vamos “Organizar” o RRAA: Apresentação da Organização (Framework) Hiper-Dimensional Multi-Nível (HDML)

A organização (Framework) Hiper-Dimensional Multi-Nível (HDML) destaca, para o estudo do Responder Relacional Arbitrariamente Aplicável (RRAA), cinco níveis relacionais: (i) implicar mutuamente; (ii) emoldurar relacional; (iii) reticular relacional; (iv) relacionar relações; e (v) relacionar redes relacionais; e quatro dimensões: (a) coerência, (b) complexidade, (c) derivação, e (d) flexibilidade. Abaixo, cada um será detalhado e exemplificado.

*A organização HDML insere em toda e qualquer instância de análise do RRAA, o orientar, evocar, e motivar, já discutidos anteriormente: https://comportese.com/2025/04/07/a-linguagem-como-parte-da-contingencia-a-unidade-de-analise-roe-m-parte-2/

Organização (Framework) Hiper-Dimensional Multi-Nível (HDML)

Implicar Mutuamente: refere-se à relação entre dois eventos. Por exemplo, Ω → ômega; isto é, esse símbolo (Ω) de alguma maneira está relacionado ao som/palavra “ômega”. Emoldurar Relacional (ou Implicar Combinatoriamente): diz respeito a relação entre três eventos, no qual duas implicações mútuas possibilita uma terceira relação. Para ilustrar, se ◕‿◕ FELIZ; e VROLIJK ◕‿◕; logo VROLIJK FELIZ. Ou seja, VROLIJK e FELIZ estão de alguma forma relacionados. Reticular Relacional: refere-se à relação entre quatro ou mais eventos. Por exemplo, ♯ → SUSTENIDO TECLADO; e ♭ → BEMOL TECLADO; logo estão de alguma forma relacionados. Relacionar Relações: nesse nível, e no seguinte, é onde respondemos ao próprio responder relacional. Relacionar Relações implica em responder a duas implicações mútuas. Para ilustrar, somos capazes de relacionar dois “conjuntos”: [Conjunto 1 (Skinner AC)] [Conjunto 2 (Freud Psicanálise)], então diríamos algo próximo de: Skinner e AC estão relacionados de alguma maneira, assim como Freud está com a Psicanálise. Por fim, Relacionar Redes Relacionais, assim como o anterior, implica em respondermos ao próprio responder relacional, contudo, em conjuntos que envolvam três ou mais eventos. Por exemplo, [Conjunto 1 (Lula PT 13)] [Conjunto 2 (Bolsonaro PL 22)], de alguma maneira o conjunto 1 se relaciona com o conjunto 2.

Coerência: refere-se a extensão que determinado responder relacional condiz funcionalmente a padrões anteriores que foram reforçados (ou não punidos) pela comunidade verbal. Por exemplo, se mulheres são pouco representadas em filmes ou estórias em livros infantis em profissões STEM [acrónimo em inglês que significa Science (ciência), Technology (tecnologia), Engineering (engenharia), e Mathematics (matemática)], ao vermos uma mulher em alguma profissão STEM, isso poderia gerar uma “certa dúvida”, dado que esse padrão relacional Mulher STEM não condiz em sua maioria com os padrões relacionais anteriores (isto é, culturalmente: Mulher profissões “de cuidado”). Dessa forma, Mulher STEM seria (para muitos) considerados “baixa coerência”, enquanto Mulher profissões “de cuidado” seriam consideradas de “alta coerência”, com base em padrões relacionais arbitrariamente estabelecidos e emitidos pela nossa cultura.

Complexidade: refere-se aos detalhes do responder relacional, em termos de número de eventos relacionados, tipo e quantidade de molduras (igualdade, distinção, oposição, comparação, etc.), e quantidade de controles contextuais. Para ilustrar, se eu digo que AMOR é “fogo que arde sem se ver”; é muito mais complexo do que dizer AMOR é “”. O primeiro padrão relacionalenvolve diversos eventos, molduras relacionais e diferentes controles contextuais. No primeiro, a chance de envolver diversos sentidos do meu corpo (por exemplo, sentir o “calor”), é muito maior que no segundo.

Derivação: remete ao quão praticado determinado responder relacional se tornou. Uma resposta relacional derivada pela primeira vez é considerada de alta derivação, a partir do momento que esta resposta vai ser tornando cada vez mais praticada, o nível de derivação diminui (isto é, se torna uma resposta de baixa derivação). Por exemplo, você se prepara para uma apresentação e na sua vez de apresentar, o monitor do seu computador para de funcionar, e então você precisa cancelar a apresentação. Vendo a reação do público você diz para si mesma “Devem achar que eu sou incompetente”. Ou seja, uma experiência fez você pela primeira vez derivar uma relação nova “Eu Incompetente” (alta derivação). Contudo, outras experiências, como planejar um date, fazer uma janta para seus pais, e organizar afazeres do dia podem levar você a derivar “Eu → Incompetente”, se esses planejamentos não saírem conforme o esperado. Ou seja, novas e diferentes experiências podem levar você a derivar funcionalmente algo próximo já derivado: “Eu → Incompetente”. Dessa forma, a relação vai se tornando cada vez mais baixa em derivação, podendo mesmo chegar em determinadas momentos de sua história de vida, que você se vê e sente incompetente em sua maior parte do tempo, e sequer sabe de onde essa resposta veio, mas está lá, em quase tudo que você faz e vem a fazer futuramente.

Flexibilidade: condiz a extensão/facilidade que determinado responder relacional pode ser alterado pela introdução de novas variáveis contextuais. Para ilustrar, dada a relação “Bolo/açúcar → é um veneno”, o quanto esse responder é facilmente alterado na introdução de variáveis contextuais como: Em festa de aniversário “Bolo/açúcar → é um veneno” ? Quando você está sozinha entediada “Bolo/açúcar → é um veneno” ?. Ou seja, em que circunstância você se permite comer bolo? Se observamos que com a introdução de variáveis contextuais como as de cima, a resposta relacional se altera, dessa forma, observamos que a resposta tem um grau maior de flexibilidade; caso contrário um grau menor de flexibilidade.     

Em síntese, a organização HDML destaca variáveis relevantes para a análise do RRAA, em contextos de estudos experimentais e aplicados; e interventivos, por exemplo: compreensão clínica do sofrimento psicológico e desenvolvimento de linguagem em crianças, entre outros.

Indicações de Leitura:

Barnes-Holmes, D., Barnes-Holmes, Y., & McEnteggart, C. (2020). Updating RFT (more field than frame) and its implications for process-based therapy. The Psychological Record70(4), 605-624.

Barnes-Holmes, D., Barnes-Holmes, Y., Luciano, C., & McEnteggart, C. (2017). From the IRAP and REC model to a multi-dimensional multi-level framework for analyzing the dynamics of arbitrarily applicable relational responding. Journal of Contextual Behavioral Science6(4), 434-445.

Barnes-Holmes, D., Barnes-Holmes, Y., McEnteggart, C., & Harte, C. (2021). Back to the future with an up-dated version of RFT: More field than frame?. Perspectivas em Análise do Comportamento12(1), 033-051.

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Escrito por Marcello Henrique Silvestre

Psicólogo (CRP 06/186284) pela FAMERP. Mestre em Análise Comportamental da Cognição pela UFSCar. Especialista em Intervenção ABA para TEA e DI. Doutorando em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela UNESP - Bauru. Coordenador SIG-RFT pela ACBS Brasil.
@psi.marcellosilvestre

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