Possíveis Modelos de Registro Comportamental na Terapia Analítico Comportamental Infantil – Parte 1

Os registros cumulativos de Skinner, utilizados amplamente em pesquisas experimentais, permitem a observação do fluxo comportamental em relação a uma classe de respostas [1]. O registro comportamental em atendimentos ou em pesquisas aplicadas possui a função de medir ou avaliar o comportamento-alvo [2]. Na Terapia Analítico Comportamental Infantil, a utilização do registro comportamental pode ocorrer nas fases iniciais e intermediárias, podendo ter diversas funções. São elas: coleta de dados mais fidedignas sobre as possíveis variáveis mantenedoras dos comportamentos-alvos; formulação do diagnóstico comportamental; direcionamento e seleção dos programas de intervenções para mudança de comportamento; avaliação do procedimento interventivo; e até mesmo ser o instrumento de intervenção, criando condições para a autonomia do cliente [1, 2, 3, 4]. 

Como instrumentos para atendimentos na Terapia Analítico Comportamental Infantil, o objetivo do presente trabalho foi construir possíveis modelos de protocolos e registro comportamental para diferentes demandas, como alimentar, emocional, sono, rotina, interação pais e filhos e comportamentos inadequados no geral, além de delineamento de objetivos terapêuticos e contrato terapêutico para a criança.

Oito instrumentos foram construídos com base na análise funcional em nível molecular e molar, podendo favorecer a identificação, manipulação e avaliação de variáveis ambientais históricas e atuais na qual o comportamento em questão é função. Esses modelos foram construídos para tanto os pais quanto as crianças preencherem.

Abaixo seguem os modelos para as crianças preencherem.

– Protocolo das Emoções

Figura 1. Folha do Protocolo das Emoções. 

Este protocolo foi denominado “Minhas Emoções”, em que é possível criar condições para 1) a coleta de informações sobre os comportamentos-alvos da criança ou de terceiros e as variáveis de controle desses comportamentos, que podem ser relevantes para a 2) formulação de análises funcionais e 3) auxiliar na construção dos objetivos terapêuticos, considerando que as emoções são um dos subprodutos da contingência [5]; 4) o estabelecimento da linha de base a ser comparado posteriormente à intervenção com o objetivo de avaliar a intervenção aplicada; 5) o treino de identificação, nomeação e exposição de sentimentos, repertórios pré-requisitos para o andamento da terapia [6]; e 6) o treino de resolução de problemas, uma vez que descrever as variáveis que atuam sob o seu comportamento pode aumentar a probabilidade de controlá-lo.

A coleta não precisa se esgotar neste instrumento: as informações registradas podem dar oportunidade ao psicólogo realizar outras perguntas relevantes. Além disso, o Livro dos Sentimentos [7] pode ser utilizado como uma atividade complementar.

Na folha do protocolo (Figura 1), à direita, são sinalizados os seguintes personagens do filme “Divertidamente”: a Alegria, o Raiva, a Nojinho, a Tristeza e o Medo, que correspondem às emoções. Abaixo de cada personagem, há uma coluna de quadrados vazados, com o objetivo da criança assinalá-los em função do que é registrado à esquerda da folha, no espaço “o que eu faço ou o que acontece”. Esse espaço é destinado à criança operacionalizar determinados comportamentos-alvos ou antecedentes e/ou consequentes que podem estar relacionados com as emoções sinalizadas. Por exemplo, “quando meu irmão pega meu brinquedo…” e, então, é assinalado com um “X” no quadrado da coluna da raiva.

Sugere-se indicar a criança assistir ao filme “Divertidamente” antes da aplicação.

– Protocolo dos Objetivos Terapêuticos

Figura 2. Folha do Protocolo dos Objetivos Terapêuticos

Este protocolo foi chamado de “Em que a psicoterapia pode me ajudar?”, com o objetivo de delinear objetivos terapêuticos com a criança. Este protocolo pode 1) permitir uma definição clara/operacionalizada, feita conjuntamente com a criança, sobre o que será trabalhado ao longo das sessões, aumentando a probabilidade de seu engajamento e de sua colaboração no decorrer da terapia (para mais informações sobre a construção dos objetivos terapêuticos com a criança e com seus pais, conferir [6]); e 2) favorecer o autoconhecimento, ao identificar, por exemplo, o que lhe faz sentir-se bem, e o que lhe faz sentir-se mal e o que pode ser mudado.

Anteriormente à aplicação deste protocolo, sugere-se o estabelecimento do vínculo terapêutico e, se necessário, realizar o treino das habilidades de identificação, nomeação, expressão dos sentimentos e auto-exposição.

A folha (Figura 2) é composta por uma tabela dividida em duas colunas, uma com o título “comportamentos para ocorrerem mais vezes” e outra “comportamentos para ocorrerem menos vezes”. Os espaços são largos com a possibilidade da criança realizar desenhos, em vez de escrever ou ditar. Por nossa cultura ser dualista e mentalista, foi proposto uma “observação” embaixo da tabela, sinalizando que comportamentos são sentimentos, pensamentos e ações. 

– Protocolo Interação Pais & Filhos

Figura 3. Folha do Protocolo de Interação com o pai
Figura 4. Folha do Protocolo de Interação com a mãe

Este protocolo é composto por duas páginas, uma denominada “Meu Pai” e, a outra, “Minha Mãe”. Os objetivos são: 1) coletar informações a respeito da interação da criança com seu pai e com sua mãe; 2) o estabelecimento da linha de base a ser comparado posteriormente à intervenção, com o objetivo de avaliar a intervenção aplicada, por exemplo, uma orientação de pais; 3) formular análises funcionais; e 4) favorecer o treino de resolução de problemas nesse contexto.  

As duas páginas (Figura 3 e Figura 4) do protocolo são idênticas, diferindo apenas no título. À direita, na folha, há o sistema de notas de 0 a 10, em que 0 corresponde a “péssimo”, 4 a “ruim”, 6 a “precisa melhorar”, 8 a “bom” e 10 a “excelente”. Próximo ao centro da folha, há retângulos vazados, em que a criança preencherá com a nota, conforme o sistema, em função das situações apresentadas à esquerda da folha. As situações foram descritas na afirmativa e são curtas e objetivas. Procurou-se operacionalizar os termos. São elas, na ordem, de cima para baixo: “me ajuda nas tarefas de casa quando preciso”; “me ouve nos meus momentos que não consigo encontrar solução para algum problema meu”; “procura brincar comigo”; “reconhece quando sigo as regras. Por exemplo, me elogia”; “procura ficar calmo comigo em uma situação problema. Por exemplo, quando erro”; “procura deixar eu fazer minhas próprias escolhas. Por exemplo, escolher que roupa vestir”; “durante as refeições, me oferece alimentos saudáveis. Por exemplo, alface, feijão…”; “mesmo que não concorde, entende minhas opiniões”; “é um modelo para eu seguir”; e “me faz sentir amado(a) independente do que eu faça”. Há a seguinte instrução: “no retângulo em branco, dê uma nota de 0 a 10 para as interações com seu pai/mãe”.

Sugere-se, antes da aplicação, que o vínculo terapêutico esteja bem estabelecido. 

Confira as Partes 2, 3 e 4 para visualização dos demais protocolos.

Para ter acesso aos protocolos desta primeira parte, mande um email para mim, amandapsico8@gmail.com, ou um direct no meu Instagram @guiapraticodospequenos (página que auxilia a prática de psicólogos infantis).

Referências:

[1] Andery, M. A. P. A. (2010). Métodos de pesquisa em análise do comportamento. Psicologia USP21(2), 313-342.

[2] Martin, G., & Pear, J. (2009). Modificação de Comportamento: o que é e como fazer. São Paulo: Rocca.

[3] Regra, J. A. (2000). Formas de trabalho na psicoterapia infantil: mudanças ocorridas e novas direções. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva2(1), 79-101.

[4] Silvares, E. F. M. (1991). O papel do registro de observação de comportanentos e da quantificação no diagnóstico clínico comportamental. Psicologia USP2(1-2), 105-109.

[5] Nery, L. B., & Fonseca, F. N. (2018). Análises funcionais moleculares e molares: um passo a passo. Teoria e formulação de casos em análise comportamental clínica, 22-54.

[6] Moura, C. B. D., & Venturelli, M. B. (2004). Direcionamentos para a condução do processo terapêutico comportamental com crianças. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva6(1), 17-30.

[7] Moura, C. B. e Azevedo, M.R.Z.S. (2000). Estratégias lúdicas para uso em terapia comportamental infantil. Em: R. C. Wielenska, (org) Sobre comportamento e cognição: questionando e ampliando a teoria e as intervenções clinicas e em outros contextos. v.6, pp. 163-170. Santo André: ESETec.

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Escrito por Amanda Viana dos Santos

Psicóloga infantojuvenil (CRP - 09/14306). Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, com Prêmio Mérito Acadêmico Magna cum laude. Mestranda na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Coordenadora da Comissão de Estudantes da ABPMC (2021). Professora convidada do curso de Pós-Graduação em Terapia Analítico-Comportamental Infantil do IBAC. Pós-graduanda em Terapia Analítico-Comportamental Infantil pelo Instituto Skinner. Durante a graduação, foi membro do Laboratório de Análise Experimental do Comportamento/PUC GO, realizando iniciações científicas na área do comportamento de escolha, autocontrole e estilos parentais (bolsista CNPq). Criadora do projeto Guia Prático dos Pequenos, disponível no Instagram @guiapraticodospequenos. E-mail: amandapsico8@gmail.com

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