A importância dos esquemas de reforço para o analista do comportamento clínico

Em toda sua obra, Skinner dedica poucos livros a temas que podemos chamar de específicos. Destacam-se três textos destes: O Comportamento Verbal(1957/1978), Schedules of Reinforcment, Esquemas de Reforço em tradução livre (1957, ainda sem tradução para o português), escrito com C. B. Ferster e Tecnologia do Ensino(1968/1972).

Os dois livros de 1957 têm suas particularidades: ainda que Skinner tenha começado a escrever O Comportamento Verbalem meados dos anos 30 (Skinner, 1957, p. vii), a importância que se deu a essa obra só começa a ser reconhecida próximo aos anos 70. E a criação do primeiro periódico para lidar especificamente com esse tipo de comportamento só foi fundado em 1982, The Analysis of Verbal Behavior, ainda em vigor. 

Já Schedules of Reinforcementé um livro que tem sua popularidade mais entre analistas experimentais do comportamento do que entre analistas aplicados e prestadores de serviço. O tema é difícil. A obra, de caráter totalmente empírico, não é de fácil leitura e os dados científicos são soberanos. Não se pretende trazer conceitos de todos os esquemas de reforço no presente texto, mas, por meio dos conceitos principais, elucidar a importância de um analista do comportamento clínico estudar o tema. 

Quando discutimos os conceitos básicos de seleção por consequências, reforçamento, punição, etc. nós falamos de classes de resposta que se seguem de consequências consistentes. No entanto, não é toda resposta que produz consequências consistentes. E quando lidamos com isso, falamos de esquemas de reforço. 

Existem dois tipos de esquema de reforço principais: os esquemas de resposta independente (que envolvem o tempo como variável crítica) e os esquemas que requerem resposta (estes nomeamos de esquemas de razão). 

Os esquemas de tempo fixo (FT) estabelecem que a ocorrência do reforço depende exclusivamente do tempo, sem qualquer tipo de responder do organismo: ele respondendo ou “parado” acarreta na providência de reforço de tempos em tempos (a cada 3min, por exemplo, previamente estabelecidos pelo experimentador).

Exatamentecomono esquema FT, o esquema de tempo variável (VT) depende exclusivamente do tempo, mas agora o tempo varia em função de uma média (VT 3min), mas a liberação de reforço é variável nesse tempo pré-estabelecido pelo experimentador. No nosso exemplo, pode-se ter liberação de reforço a cada 2min, a cada 5min… a propriedade importante é que o responder do organismo é indiferente. 

Já num esquema de razão fixa (FR), cada número de respostas pré-estabelecido produz um estímulo reforçador (Ferster & Skinner, 1957). Em FR, quanto maior a taxa de respostas, menor é o tempo para se receber o reforçador; por isso, maior a taxa de reforço provido. Quanto mais respondo, menos tempo demoro parater a consequência, isso explica o motivo pelo qual um organismo se comporta em altas taxas de frequência de resposta. 

Num esquema de razão variável (VR), o reforçamento ocorre após um dado número de respostas, este variando imprevisivelmente entre um reforçamento e outro (Ferster & Skinner, 1957). Esquemas de VR produzem uma variedade de performances no comportamento do organismo, a depender da distribuição do número de respostas requeridas por reforçador. Em esquemas VR, altas taxas de respostas produzem altas taxas de reforço (Catania, 2013). 

Quando há essas quedas nas taxas de responder devido às pausas por conta de uma razão muito grande, a extinção depois de reforço em VR comumente produz transições abruptas de altas taxas para períodos de ausência total de resposta.

Há também os esquemas de intervalo. Eles combinam esquemas de tempo e razão pois dependem tanto do tempo como pelo menos de uma resposta do organismo naquele tempo determinado no esquema para que haja liberação de reforço. Nos esquemas de tempo, se o organismo respondia ou ficava “parado” não importava. Aqui, importa: haverá reforço a cada 3min, mas apenas se o organismo responder. 

E há esquemas que operam em função da probabilidade de reforço: Tempo Aleatório, Razão Aleatória e Intervalo Aleatório. Todos eles são não contingentes e menos eficazes à manutenção do comportamento.

Ok. Ainda que se tenha apresentado de maneira absolutamente superficial os conceitos dos principais esquemas de reforço, qual é a importância disso para um analista do comportamento que não está inserido num laboratório? Seria de bom grado que a resposta fosse óbvia: se estamos falando de produção inconsistente de consequências, estamos falando de consequências intermitentes ou parciais. 

No laboratório, possuímos um ambiente controlado, produzimos intermitência e consequências parciais deliberadamente. Na vida real, no ambiente fora do laboratório, o controle é absolutamente ilusório: quando falamos da vida diária estamos, fatalmente, falando de consequências intermitentes e/ou parciais. 

Quando se estuda os esquemas de reforço na graduação, os exemplos mais comuns que recebemos é de recebimento de salário ao fim do mês ou todo dia X de cada mês, de esquemas de produção por peça em fábricas para que se ganhe dinheiro, os ótimos e clássicos exemplos de jogos de azar, já se aproximando de demandas clínicas: ganhar ‘uma vez na vida e outra na morte’ faz com que a pessoa vicie em casinos. 

No entanto, podemos aplicar esses conceitos a outros fenômenos não tão incomuns ao consultório: um indivíduo acostumado a ser paparicado pelos pais, recebendo reforço em excesso por custos de resposta baixíssimos, quando vai morar sozinho não só não tem esse apoio e há uma mudança em diversos outros aspectos comportamentais de controle de estímulos (que não abordaremos aqui), mas há uma mudança substancial em esquemas de reforço: agora preciso me comportar mais, preciso responder mais e melhor, sozinho, para obter consequências que antes obtinha facilmente no ambiente familiar. 

O próprio comportamento verbal mostra o efeito da intermitência: uma vez que aprendemos a falar “não”desaprendemos e, talvez a nível molar, o comportamento verbal “não”possa ser posto em extinção, afinal, falamos consigo mesmos. 

Clientes que porventura busquem terapia pelo excesso de necessidade de controle e pela evitação exacerbada de qualquer tipo de evento aversivo podem justamente estarem em terapia por não conseguirem lidar com a incontrolabilidade e imprevisibilidade que os determinados esquemas de reforço em que está inserido produzem em sua vida. 

Esses são exemplos muito supérfluos de como os esquemas de reforço podem ser cruciais para o analista do comportamento clínico, mais do que isso, ouso dizer que a negligência dos esquemas de reforçopodenos impedir de chegar a respostas cruciais para toda a análise de comportamento que quisermos fazer, tanto no settingterapêutico como em settingsaplicados. 

Keller e Schoenfeld (1950) afirmam que sem uma concepção de comportamento verbal, não chegaremos a uma compreensão real de comportamento humano. Talvez o mesmo se aplique aos esquemas de reforço. Irônico o ano de 1957: as obras que nos presenteiam com análises riquíssimas sobre ambos os temas talvez sejam as que mais precisam de analistas do comportamento se debruçando sobre.

Referências

Catania, A. C. (2013) Learning. 5th Edition. Sloan Publishing 

Ferster, C. B.; Skinner, B. F. (1957) Schedules of Reinforcement. New York: Appleton-Century Crofts

Keller, F. S.; Schoenfeld, W. N. (1950) Principles of Psychology. Cambridge: Copley Publishing Group.

Skinner, B. F. (1957) Verbal Behavior. New York: Appleton-Century Crofts

Skinner, B. F. (1968) Technology of Teaching. Cambridge: Copley Publishing Group.

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Escrito por Renan Miguel Albanezi

Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário Cesumar (UniCesumar), especialista em Análise do Comportamento e Psicoterapia Cognitivo-Comportamental pelo Núcleo de Educação Continuada do Paraná (NECPAR) e em Terapia Comportamental pela Universidade de São Paulo (USP). Tem como principais áreas de estudo o Behaviorismo Radical e a Análise do Comportamento com interesse em comportamento verbal, agências controladoras do comportamento, psicoterapia comportamental e psicoterapia analítica funcional.

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