Enquanto muitos terapeutas estão familiarizados com este termo, muitos outros não entendem o que esse movimento quer dizer. A discussão a respeito deste tema ainda tem muito que caminhar no Brasil mas, embora pouco discutida por aqui ao ouvir falar sobre o tema, levanta-se uma série de questionamentos na comunidade verbal e dá até um frio na barriga. Esta discussão está diretamente ligada com a prática do psicólogo clínico. E inquietações vão surgindo…
O que está sendo feito dentro dos consultórios? Como é possível medir a eficácia das intervenções, estratégias, técnicas e abordagens que o terapeuta analítico comportamental e os demais estão utilizando? Como medir tudo isso? É preciso medir?
Embora haja tantos ensinamentos, em toda a formação do psicólogo clínico, algo difícil de fazer é medir o quê e como está sendo realizado o atendimento de cada cliente. Se está certo ou se está errado, se está produzindo ganhos e por aí vai. Claro que alguns comportamentos são considerados muito “inadequados” e outros considerados bastante relevantes no comportamento do terapeuta para que ocorra um bom atendimento clínico; para a manutenção do cliente no processo e para o sucesso terapêutico, ou seja, o alcance dos objetivos de ambos. Empatia e audiência não punitiva são alguns comportamentos citados na literatura que estão relacionados a postura do terapeuta, e que são relatadas como importantes e necessárias para o sucesso de uma terapia.
A Prática Baseada em Evidencias surgiu na década de 90 na medicina e passou com os anos a instigar profissionais de outras áreas a buscarem evidências de suas práticas. E aqui estamos nós, terapeutas, nos perguntando sobre o impacto da Prática Baseada em Evidências na psicologia clínica analítico comportamental. Tudo se iniciou com Eysenck (1952), citado em Leonardi e Meyer (2015) que foi um psicólogo alemão que publicou uma revisão de 19 artigos empíricos de psicoterapia daquela época nos quais seus resultados e conclusões levantaram bastantes pontos de vista, o que dividiu a opinião de muitos autores. Além disso, seu trabalho fomentou a busca por demonstrações de resultados e eficácia da psicoterapia clínica. Os resultados apresentados por Eysenck (1952) em seu estudo, dizia que após certo tempo do início da doença, sendo esta tratada por meio de psicoterapia ou não, ocorria a melhora. Os trabalhos de Leonardi e Meyer (2015) apresentam o desenvolvimento da Prática Baseada em Evidências sobre uma perspectiva histórica e também sobre o status atual das evidências de eficácia de um ramo da análise do comportamento aplicada.
Enquanto terapeutas clínicos ouvimos sempre sobre a importância de nos aperfeiçoarmos e que se seguirmos alguns critérios teremos resultados no processo terapêutico que realizamos em nossos consultórios e clínicas pelo mundo afora. E ao entrar em contato com esse movimento ficamos um pouco preocupados porque vem crescendo a demanda por evidências nos tratamentos e então surge mais um questionamento. Quem está buscando resultados para que isso ocorra? Quem são as pessoas que estão pesquisando isso fora e no Brasil? O que fazemos está sendo baseado em evidências? Como saber? E como pesquisar?
Segundo Leonardi & Meyer (2015), a escolha pela melhor intervenção a ser aplicada no consultório clínico depende de uma série de fatores e dentre eles pode-se citar a experiência do terapeuta e sua afinidade por algumas maneiras de realizar o atendimento clínico e por determinadas estratégias. Ainda de acordo com os autores, o surgimento da Prática Baseada em Evidências tem relação com vários fatores científicos, sociais, econômicos e políticos. E sim, atualmente no Brasil alguns grupos estão se dedicando a esse tipo de pesquisa, o que nos diz que os analistas do comportamento estão gradualmente buscando comprovar de forma empírica a eficácia de suas intervenções e desse modo abandonando o “excesso de confiança translacional” nos dados de pesquisa básica (Leonardi & Meyer, 2016).
Buscar evidências em relação à efetividade de tratamentos psicoterápicos significa entender o que ocorre dentro do consultório, identificando no comportamento do terapeuta, do cliente, nas intervenções realizadas, comportamentos e manejos clínicos que podem trazer resultados eficazes ao processo. Como podemos medi-lo e saber qual o comportamento, se do terapeuta ou do cliente, está por traz das mudanças que ocorrem com cada cliente é um dos objetivos desse movimento, ou seja, como estabelecer critérios preditores de uma terapia eficaz?
Luborsky (1975) citado em Leonardi e Meyer (2015) fala dos fatores comuns que são características atribuídas a diversos tratamentos e as muitas intervenções realizadas. Encontram-se entre elas, qualidades do terapeuta, características do cliente e relação terapêutica. Alguns pesquisadores da terapia cognitivo comportamental levaram em consideração os chamados fatores específicos que seriam os procedimentos, técnicas e estratégias presentes em cada maneira de intervir, por exemplo.
Por conseqüência também desse movimento, surgiu a divisão 12 da APA, que desencadeou também muitas críticas e insatisfações por todos os lados, mas que tinha o objetivo de definir e identificar tratamentos empiricamente validados. Hoje, já é possível encontrar muitas evidências em relação a alguns tratamentos, como os que são apresentados no manual da Divisão 12, mas que ainda são alvo de muitas indagações, porque também se discutem nesse contexto os critérios do que seria uma boa evidência ou evidência de qualidade e sobre os limites da PBEP. Alguns autores brasileiros realizaram estudos e revisões sistemáticas sobre algumas modalidades em análise do comportamento como a FAP, ACT, DBT E BA e foi identificado que as pesquisas ainda carecem de maior rigor para avaliar a efetividade de suas intervenções ( Leonardi & Meyer, 2016).
A Prática Baseada em Evidências está no centro de muitas discussões e ainda tem muito a dizer a nós, terapeutas clínicos e pesquisadores. Podemos fazer a nossa parte consumindo mais pesquisas a respeito do que ocorre dentro do consultório clínico (Comportamento terapeuta, cliente e intervenções). E para quem se interessar por pesquisa, deve criar condições para que trabalhos com foco no entendimento das chamadas pesquisas de processo sejam mais realizadas. Carecendo ainda de evidências dos processos ocorridos em sessão e sua eficácia, precisamos estar atentos aos nossos comportamentos enquanto profissionais da área clínica da psicologia e analistas do comportamento e buscar realizar o melhor pelo nosso cliente, sempre buscando critérios para seguir uma profissão com cuidado e profissionalismo até que mais evidências sejam produzidas e apresentadas e nos mostre mais uma forma de vivenciar a prática clínica.
Referências Bibliográficas
Leonardi J. L., & Meyer, S. B. (2015). Prática baseada em evidencias em psicologia e a história da busca pelas provas empíricas da eficácia das psicoterapias. Psicologia: Ciência e Profissão, 35 (4), 1139-1156 doi: 10. 1590/1982-370300155201
Leonardi J. L., & Meyer, S. B. (2016). Evidências de eficácia e o excesso de Confiança translacional da análise do comportamento clínica. Temas em Psicologia, 24(4), 1465-1477 doi: 10.9788/tp2015.4-15Pt