Efeitos do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) na vida adulta Parte I – Avaliação na prática clínica

Efeitos do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) na vida adulta: Parte I – Avaliação na prática clínica
Autora: Cíntia Aparecida Barbizan (Instituto Innove)

O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) ou é uma condição neurobiológica que atinge de 3% a 7% da população, caracterizando-se por um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade, mais frequente e grave do que aquele normalmente observado em indivíduos em nível equivalente de desenvolvimento. O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (American Psychiatric Association – (DSM-IV), 2002), o classifica dentro da categoria dos Transtornos Hipercinéticos, podendo ser encontrado em três tipos: o combinado, o predominantemente desatento e o predominantemente hiperativo/impulsivo Foi oficialmente reconhecido em sua forma adulta somente em 1980, pela Associação Americana de Psiquiatria, na sua terceira edição (DSM-III, 1980).

Em crianças, o TDAH vem sendo tratado por quase um século, mas somente há algumas décadas foi dada atenção ao fato de que esta patologia persiste na vida adulta. Estudos realizados, principalmente, por Barkley (2006) estimam que uma parcela das pessoas que tiveram TDAH na infância mantém o transtorno na vida adulta, porém o seu reconhecimento tardio traz controvérsias quanto à extrapolação dos achados nos estudos com crianças para adultos. Ainda de acordo com o mesmo autor, os sintomas podem persistem na vida adulta, interferindo consideravelmente nas esferas: acadêmica, profissional, afetiva e social dos indivíduos portadores.


O transtorno em adultos tem sido visto, muitas vezes, como um problema “camuflado”, pois seus sintomas podem estar mascarados, ou por serem comórbidos ou por serem confundidos com outras patologias. Desta maneira, o diagnóstico se torna difícil e o tratamento pouco efetivo. Contudo, a realização do diagnóstico clínico aliado a análise funcional dos comportamentos-problema fornecem subsídios para mudanças comportamentais que poderão reduzir os sintomas e produzir melhoras significativas na qualidade de vida desses indivíduos.

O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (American Psychiatric Association, 2002), indica uma série de critérios para diagnóstico do TDAH, diferenciando os critérios de desatenção, hiperatividade, impulsividade e critérios gerais. De acordo com o DSM-IV, diagnóstico de TDAH deve ser feito quando há confirmação de seis ou mais sintomas no âmbito da desatenção e/ou seis ou mais sintomas no âmbito da hiperatividade e impulsividade. Se o indivíduo atende apenas aos critérios para desatenção, o diagnóstico será de TDAH do tipo predominantemente desatento. Se ele atende apenas aos critérios para hiperatividade e impulsividade, o diagnóstico será de TDAH do tipo predominantemente hiperativo-impulsivo. Se o indivíduo apresentar seis ou mais sintomas tanto no âmbito da desatenção quanto no da hiperatividade e impulsividade (isto é, pelo menos 12 sintomas), o diagnóstico será de TDAH do tipo combinado. Porém vale ressaltar que os critérios foram baseados, principalmente, em manifestações infantis, sendo assim, se torna ainda mais relevante o uso de referenciais teóricos para o entendimento e a contextualização dos sintomas.

Os estudos atuais têm identificado alguns sintomas que aparecem com maior frequência em adultos com diagnóstico de TDAH, entre eles, estão: dificuldades de relacionamento afetivo e interpessoal, de manutenção da atenção por um período longo; de permanência em atividades monótonas; falta de organização; planejamento de rotinas; instabilidade profissional que persiste ao longo da vida; falta de motivação, interesse por determinadas atividades e por curtos períodos, insônia, humor instável, esquecimentos, perdas e descuidos importantes; impulsividade, distrações constantes; abuso de substância, etc (Mattos et al, 2006)

Embora exista certa frequência de alguns sintomas presentes no quadro de TDAH, o diagnóstico deve ser sempre fundamentado no quadro clínico comportamental. De acordo com Rotta (2006), é preciso que na prática clínica seja feita uma avaliação que englobe diversos aspectos de vida do cliente, como: a queixa que motivou a procura por atendimento, como se deu o desenvolvimento na infância, a história familiar e se os familiares também identificam os sintomas, surgimento dos sintomas, a presença da sintomatologia em diversos contextos, história psiquiátrica; como se dão os relacionamentos afetivos e interpessoais, se há ou não comorbidades; avaliação intelectual e das funções executivas.

Além do levamento clínico, podem ser utilizados também testes neuropsicológicos, como WAIS-III e Wisconsin e, escalas de comportamento, como Conners, ACEeRS, SNAP-IV e ASRS. Até o momento, os testes psicométricos, neurológicos ou laboratoriais por si só não são suficientes para o diagnóstico de TDAH. Sendo assim, o diagnóstico deve ter embasamento clínico em um composto de evidências derivadas da história, da observação, do exame clínico e neurológico e das escalas de comportamento. Para avaliação ou mesmo suspeita do quadro de TDAH na prática clínica torna-se imprescindível que o profissional mantenha-se sempre atualizado no que se refere à literatura especializada, pois ainda há divergências entre os critérios de diagnóstico que são utilizados (Rotta, 2006; Barkley, 2006)

Na prática clínica, o profissional deve se munir do maior número de informações possíveis e desenvolver o raciocínio clínico baseado nos seus achados para identificar ou não a presença do transtorno, bem como se ele se apresenta de forma isolada ou com comorbidades. Somente assim, será possível entender as áreas que sofrem maiores prejuízos e intervir de forma a traçar alternativas de tratamentos e mudanças comportamentais que favoreçam as melhoras, sejam elas no âmbito afetivo, social e/ou profissional.

É possível observar que o diagnóstico do quadro de TDAH em adultos está relacionado em grande grau às dificuldades enfrentadas, principalmente, nas relações sociais e profissionais, desta forma, continuarei abordando quais os efeitos no dia-a-dia desses portadores e o quanto algumas esferas de sua vida podem estar comprometidas devido ao mau entendimento de suas dificuldades de organização e planejamento.

Referências:

American Psychiatric Association (2002). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (4a ed., texto revisado). Porto Alegre: Artmed.

American Psychiatric Association (1980). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (3a ed.). Porto Alegre: Artmed.
Barkley, R. A. (2006). Transtorno do déficit de atenção/hiperatividade: Manual para diagnóstico e tratamento (3a ed.). Porto Alegre: Artmed.
Mattos et al. (2006). Painel brasileiro de especialistas sobre diagnóstico do transtorno de déficit deatenção/hiperatividade (TDAH) em adultos. Rev Psiquiatr RS jan/ab 28(1):50-60.
Rotta, N. T. (2006). Transtorno da atenção: aspectos clínicos. In: Transtornos da Aprendizagem: abordagem neurobiológica e multidisciplinar. Porto Alegre: Artmed.
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