Prezados,
O programa “Saia Justa”, veiculado pela GNT, exibiu uma matéria intitulada New Behaviorismo, na qual foram exibidas cenas do filme Laranja Mecânica, que, segundo a apresentadora, representa uma crítica às teorias do psicólogo americano B. F. Skinner. Ela explica:
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Alex.Filme Laranja Mecânica. |
“Em ‘A Laranja Mecânica’, o personagem do criminoso Alex é submetido a uma terapia sádica de modificação do comportamento. O clássico, do diretor Stanley Kubrick, é baseado no romance homônimo de Anthony Burgess, publicado há 50 anos, e a referência à terapia era uma crítica às teorias deste psicólogo: B. F. Skinner. Ele era defensor de um Behaviorismo Radical, denunciado na época como autoritário. Uma tentativa de controlar o comportamento da população. Mas, meio século depois, é a população que está tentando se controlar. A Tecnologia inspirou um tipo de Behaviorismo da autoajuda. Graças aos Smarthphones e Tablets, nós agora temos à disposição aplicativos para modificar comportamentos e viver melhor...” (continua no vídeo)*.
Em um movimento coletivo, os analistas do comportamento brasileiros estão contatando a produção do programa através de seu formulário próprio de contato e expressando indignação pela leviandade com que a abordagem foi tratada. Várias pessoas, sites se páginas no facebook já estão participando. Se você também se sentiu indignado, faça sua parte e entre em contato solicitando uma retratação
clicando aqui.
*O vídeo não foi “linkado” para evitar que ganhe posições no ranking do Google e apareça nas primeiras páginas na busca por “Behaviorismo”. No entanto, pode ser encontrado com as palavras chave “New Behaviorismo GNT”, no Google.
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B. F. Skinner nunca foi defensor de métodos aversivos. |
O Behaviorismo já é uma abordagem cercada de mitos e equívocos, e falas como as da apresentadora do programa, que é veiculado em rede nacional em emissora com grande alcance na população em geral, podem ter como efeito uma rejeição ainda maior às teorias behavioristas.
Com vistas a sanar possíveis dúvidas geradas pelo vídeo, gostaríamos de comentar alguns das falas da apresentadora do programa. A primeira:
“Em ‘A Laranja Mecânica’, o personagem do criminoso Alex é submetido a uma terapia sádica de modificação do comportamento (…) e a referência à terapia era uma crítica às teorias deste psicólogo: B. F. Skinner (…) denunciado na época como autoritário”.
Em primeiro lugar, o filme mostra a aplicação de técnicas baseadas no Paradigma Respondente, descoberto pelo fisiologista russo Ivan P. Pavlov. O Paradigma Respondente propõe que quando um estímulo qualquer que gera um comportamento específico é apresentado repetidas vezes temporalmente próximo a outro estímulo qualquer que não gera aquele comportamento, ocorre um processo chamado “Pareamento”, no qual este segundo estímulo passa a gerar o mesmo comportamento que o primeiro gera.
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Ivan. P. Pavlov. |
A Terapia de Modificação do Comportamento, por outro lado, é baseada no Paradigma Operante, sistematizado pelo psicólogo americano B. F. Skinner. O Paradigma Operante propõe que o comportamento de um organismo gera mudanças no ambiente e que estas mudanças aumentam ou diminuem a probabilidade do comportamento que as gerou voltar a ocorrer. Quando elas aumentam a probabilidade deste comportamento, são chamadas de Reforçadoras. Quando diminuem, são chamadas de punidoras.
Este é o primeiro equívoco deste trecho. A apresentadora mistura os dois paradigmas em um só e atribui a Skinner um processo cujo responsável pela descoberta foi Ivan P. Pavlov.
O segundo equívoco reside na sugestão de que as idéias e Skinner pregavam o uso de controle aversivo para a mudança de comportamento. Quem já teve o mínimo contato com a obra do autor sabe que se trata de uma inverdade. Skinner era claro quanto à sua posição: “Você não pode em última instância, impor coisa alguma. Nós não usamos a força!” (Skinner, em 1948) [grifo nosso].
A segunda fala da autora que merece ser comentada é:
“Ele era defensor de um Behaviorismo Radical, denunciado na época como autoritário.”
“Behaviorismo Radical” é o nome da filosofia da ciência fundada por B. F. Skinner e, a expressão “Radical”, pode ser interpretada de várias formas. A primeira delas, e mais comum, é aquela que entende “Radical” como “ir à raiz do problema”, ou, em outros termos, buscar as verdadeiras causas do sofrimento do cliente. A segunda delas, também bastante usual, é aquela que entende a expressão como “rompimento radical com as outras teorias psicológicas”, no sentido de que as explicações behavioristas para o comportamento humano diferem diametralmente daquelas oferecidas pelas demais teorias. Uma discussão mais detalhada sobre o assunto pode ser encontrada no livro “Sobre O Behaviorismo” (1974), escrito pelo próprio Skinner e publicado no Brasil pela editora Cultrix.
A despeito do exposto, a fala da apresentadora dá a entender que a expressão “Radical”, da expressão “Behaviorismo Radical”, significa algo como “exagerado”, que seguido da frase “denunciado na época como autoritário”, reforça a idéia de um psicólogo que pregava o uso de técnicas aversivas na terapia. Esta idéia já foi discutida aqui e cremos não carecer adentrar mais o assunto. Em todo caso, maiores informações sobre o tema podem ser obtidas na obra do próprio autor, nos capítulos 11 e 12 do livro Ciência e Comportamento Humano (1979), publicado no Brasil pela Editora Fontes Ltda.
Contamos com a colaboração de todos neste manifesto e torcemos para que a GNT repare o erro cometido.
Equipe Comporte-se: Psicologia Científica
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