Terapia de Casal: quando recomendar?


Quando devemos recomendar terapia de casal para alguém?
A psicoterapia ainda é uma prática muito pouco difundida, e se verifica com frequência que o leigo tem dificuldade de saber quando buscá-la ou não. Ao falarmos de terapia de casal, penso que as dúvidas são ainda maiores, e que há diferenças entre essas práticas que sugerem recomendações diferentes para cada uma delas (terapia individual e terapia de casal). Para apresentar minha opinião a este respeito, percorrerei um caminho um pouco tortuoso, mas penso que ilustrativo.
Começo perguntando ao leitor: por que algumas práticas saudáveis não fazem parte de nossa rotina? 
Nós, diariamente, dormimos, alimentamo-nos, tomamos banho e, na maioria dos dias, trabalhamos. Todos estes comportamentos são (guardadas as proporções adequadas) saudáveis para nós. Por outro lado, há uma série de outras coisas que são importantíssimas para nosso equilíbrio físico e emocional e para as quais damos pouca ou nenhuma atenção, como exercícios físicos, encontrar amigos, sairmos para nos divertir e nos conhecermos.
Todas as atividades acima deveriam fazer parte de nossa rotina, pois elas contribuem para nosso bem-estar global. Eu poderia listar os benefícios que cada uma delas podem nos trazer, mas isto faria com que este artigo ficasse extenso e, por não se tratar de nosso objetivo principal, correria um risco desnecessário (do leitor abandonar a leitura antes do final). Então, vou me ater apenas à última delas, nos conhecermos.
A terapia é um recurso desenvolvido para nos auxiliar na compreensão e modificação (quando necessária) de nosso modus operandi. Ou seja, é um processo pelo qual aprendemos a identificar como se estabelecem e o que mantém nossos comportamentos, nossas relações (sejam no contexto pessoal, afetivo, profissional, social, etc.). Através deste autoconhecimento, estaremos mais preparados a modificá-los quando verificarmos que a maneira como estamos vivenciando-os está nos trazendo sofrimento ou que sendo eles modificados poderemos obter ganhos no que se refere a “benefícios emocionais”. Assim, podemos caracterizar a terapia como um recurso desenvolvido para nos auxiliar a manter nosso equilíbrio emocional. 
Estes benefícios que a terapia pode proporcionar para o indivíduo podem se destinar ao seu bem-estar global, ou se direcionar a algum aspecto de sua vida. No primeiro caso, estamos falando da terapia individual, quando o cliente e seu analista/terapeuta trabalharão em diferentes frentes, tais como relacionamentos profissionais, familiares, pessoais, amorosos, etc., em busca de um equilíbrio emocional global, sendo esta altamente recomendável por mim, com praticamente nenhuma contraindicação. 
No caso de um trabalho “mais focado”, elege-se qual aspecto será alvo do trabalho. Como o próprio termo “focado” sugere, não se trata de algo para o bem-estar global, mas sim específico. Neste caso, sua recomendação também deve ser mais específica.
Se retomarmos a questão inicial — que é: quando se justifica uma terapia de casal? —, diria que uma terapia de casal se justifica em casos em que há grande sofrimento para manter a relação por ambos, ou a comunicação entre o casal não ocorre, ou ainda há o desejo de um dos membros de reformular a relação e a dificuldade pela outra parte de aceitar a mudança, entre outras possibilidades. Resumindo, a princípio, a terapia de casal é recomendável em casos que pelo menos um integrante do casal apresente sofrimento em decorrência das experiências vividas naquela relação. 
Porém, diferentemente da terapia individual, a qual acredito poder ser recorrida quase que sem restrições, não recomendaria a terapia de casal a todos os casos. Uma situação que eu a contraindicaria seria quando o problema que gera sofrimento a um dos membros do casal é o mesmo que ele vivencia em outros aspectos de sua vida e, ao mesmo tempo, o outro membro do casal não vê nenhum problema na relação. Por exemplo, uma das partes relata ter medo de ser abandonada pela outra, mesmo não se verificando indícios que isso está prestes a ocorrer – ao contrário, a outra parte reafirma que está satisfeita com a relação –; e, medo de perder o emprego, os amigos, etc. Neste caso, minha sugestão seria que este indivíduo buscasse se engajar em uma terapia individual, pois seria mais proveitoso para ele do que a terapia de casal.
Resumindo, a terapia de casal deve ser indicada mais em casos que há problemas específicos na relação afetiva e que dizem respeito aos membros do casal. Neste caso, difere da terapia individual, que, como defendi mais no início deste artigo, é altamente recomendada ainda que puramente como forma de autoconhecimento, independentemente da existência ou não de problemas imediatos.
Sugestão de leitura: 
Borges, N. B., & Cassas, F. A. (2012). Clínica Analítico-Comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto Alegre: Artmed.
Delitti, M., & Derdyk, P. (2008). Terapia Analítico-Comportamental em Grupo. Santo André: ESETec.
Yalom, I. D. (2006). Psicoterapia de Grupo: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed.
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Escrito por Nicodemos Borges

Psicólogo, Doutor e mestre em Análise do Comportamento pela PUC-SP, Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP, Master Coach pelo CAC. Atualmente É coach e CKO do Instituto NB; CEO e Psicólogo clínico responsável no Contexto Análise do Comportamento; e, professor, supervisor clínico, pesquisador e orientador no curso de Psicologia da Universidade São Judas Tadeu - USJT. É editor-associado de Perspectivas em Análise do Comportamento. Integrou o conselho internacional da Revista GEPU, a Comissão Executiva da Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva - RBTCC e comissões científicas de congressos nacionais e internacionais. Apresentou diversos trabalhos em congressos nacionais e internacionais, tem artigos publicados em diferentes periódicos científicos, capítulos de livros, além de ter organizado livro sobre Clínica Analítico-Comportamental. É autor da primeira Tese de Doutorado relacionando coaching e análise do comportamento no Brasil.

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