Como faço para me conhecer?

Extraído de http://clubedamafalda.blogspot.com.br/
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Quem nunca se perguntou por que algo que fez deu errado, ou comparou seu desempenho ao de alguém que teve mais êxito ou sucesso? Um aspecto destas perguntas pode ser pernicioso, por levar a uma situação de competição, que nem sempre é bem-vinda. Outro aspecto, entretanto, pode nos ser de grande valia. Afinal, temos uma grande capacidade para observar nosso o ambiente e, como parte dele, o comportamento das pessoas. Como um dos ganhos, aprendemos bastante sobre nós mesmos neste exercício que parece de observação de terceiros, mas que pode revelar-se um passo para conhecer a si mesmo.

Dentro de um referencial comportamental, o autoconhecimento pode ser definido como a identificação que um indivíduo faz sobre as contingências de reforçamento em que está inserido, sobre como se comporta nos ambientes e situações (Skinner, 1974). Mais especificamente, diz-se que um indivíduo tem “consciência de si mesmo” quando consegue identificar as condições antecedentes (primeiro termo de uma tríplice contingência) que evocam os seus comportamentos, ou seja, quais condições são necessárias e suficientes para que ele apresente determinadas ações. O segundo componente da tríplice contingência são justamente as ações (ou respostas) apresentadas por este indivíduo na presença das condições antecedentes. Aqui já temos um cenário para que o indivíduo se comporte, entre em cena. Para completar a tríplice contingência, o terceiro aspecto a ser identificado são as consequências produzidas pelas respostas apresentadas nas condições ambientais explicitadas. Pode parecer simples, mas nem sempre é fácil. Por isso, vamos entender um pouco sobre como o autoconhecimento pode ser desenvolvido.

B. F. Skinner propõe que conhecer a si mesmo é produto da nossa interação social, ou seja, as pessoas com quem convivemos é que nos ajudam a desenvolver este repertório. Nas palavras do autor: “O conhecimento de si próprio tem origem social e é inicialmente útil para a comunidade que propõe perguntas. Mais tarde, torna-se importante para a própria pessoa (…)” (1974, p. 146). Isto significa que é a nossa comunidade verbal quem nos faz perguntas sobre nós mesmos, e nos ensina a nomear o que estamos fazendo, bem como o que sentimos e pensamos.

Quanto a este aspecto do que se pode vir a conhecer sobre nós mesmos, vale lembrar a distinção entre nossos comportamentos públicos e privados. Comportamentos públicos são aqueles passíveis de observação por terceiros. Aprendemos inicialmente sobre eles para, em seguida, tratarmos dos comportamentos encobertos ou privados, que são sensações corporais, pensamentos e outros aspectos que não podem ser observados por uma terceira pessoa, apenas relatados pelo indivíduo que os vivencia (Skinner, 1974).

Toda comunidade verbal (pessoas com quem convivemos e interagimos) adota procedimentos para que os indivíduos conheçam a si mesmos. O processo terapêutico é uma das ferramentas que favorece o autoconhecimento. Os clientes relatam uma queixa específica que os fez buscar terapia, porém o conteúdo abordado no processo terapêutico vai muito além desta queixa inicial. O terapeuta identifica outras dificuldades comportamentais não abordadas pela queixa, bem como os outros comportamentos que o indivíduo já apresenta e que lhe permitem uma adaptação e interação com seu meio de vida. Ao analisar como um indivíduo se comporta nos ambientes em que está inserido, o terapeuta levará também seu cliente a identificar estes padrões de comportamento. Está plantada a semente do autoconhecimento.

Um indivíduo que possui um conhecimento sobre a maneira com que se comporta nos diferentes ambientes estará mais preparado para identificar situações oportunas e inoportunas para agir, poderá prever com mais segurança suas reações frente aos eventos, e também poderá generalizar seus aprendizados de uma situação para outras semelhantes. Aprenderá também sobre quais são suas habilidades e dificuldades, o que o tornará mais direcionado ao desenvolvimento de comportamentos relevantes que ainda não tenham sido adquiridos. Em suma, um indivíduo que se conhece pode estar mais preparado para lidar com o ambiente à sua volta

 

REFERÊNCIAS

Guilhardi, H. J. (2010). A metamorfose de narciso e o autoconhecimento – um ensaio. Disponível em http://itcrcampinas.com.br/txt/ametamorfose.pdf

Guilhardi, H. J. (2013). Objetivo – subjetivo e público – privado. Disponível em http://www.itcrcampinas.com.br/txt/objetivo.pdf

Skinner, B.F. (1974). O eu e os outros. Em B. F. Skinner. Sobre o behaviorismo (pp. 145-162). Tradução Maria da Penha Villalobos. São Paulo: Editora Cultrix.

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Escrito por Marília Zampieri

Graduada em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos - UFSCar, Especialista em Psicologia Clínica Comportamental pelo Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento - ITCR-Campinas, Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos - UFSCar. Atua como psicóloga clínica e supervisora de atendimentos a adultos em Campinas - SP e online, e como supervisora dos cursos de especialização do ITCR - Campinas.
Possui acreditação como Analista do Comportamento pela ABPMC.

Boteco Behaviorista #41 – Economia Comportamental

Dica de revista – ACTA COLOMBIANA DE PSICOLOGÍA